Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



quinta-feira, 11 de abril de 2024

’25 de abril’: mitos, recordações e desafios

 

Tinha quinze anos quando aconteceu a ‘revolução do 25 de abril’, que fez cair – de podre e sem estrondo – o regime do designado ‘estado novo’. Apesar de ser adolescente e de estar em regime de internato fomos informados pelos superiores, de forma sucinta, dos acontecimentos na capital... Da experiência de ter vivido mais de metade dos cinquenta anos da (dita) democracia na região da capital, deixarei algumas leituras e incidências, agora que vou deixar esse espaço de macrocefalia (a diversos níveis) do nosso país...


1. Qual o balanço dos três ‘des’ (democratizar, descolonizar e desenvolver) enunciados pelos mentores do ‘movimento das forças armadas’?

Dos três ‘D’ vejamos as propostas – fui consultar às informações ao tempo veiculadas – e questionemos as consequências... cinquenta anos decorridos:

- Democratizar: a ‘revolução dos cravos’ trouxe a democracia a Portugal, pondo fim a décadas de ditadura;

- Descolonizar: o processo de descolonização permitiu a independência de várias colónias portuguesas em África e na Ásia;

- Desenvolver: O desenvolvimento do país foi uma meta importante, visando melhorar a qualidade de vida, a educação, a saúde e a infraestrutura (habitação).

Reparemos que, algumas destas ideias, estiveram ainda em confronto nas eleições mais recentes: pouco mudou, muito desiludiu e, de tantas formas, olhamos para o que quase nada foi realizado…

2. O cançonetismo alfabetizou?

Uma das facetas mais significativas e quase lúdicas dos primeiros tempos após a ‘revolução de abril’ foi a proliferação de canções – para uns de mensagem, para outros de contestação e para boa parte de mentalização. Com efeito, muitas das letras e das músicas conseguiam deixar no ouvido algo que ainda hoje se pode recordar. Embora a mais celebrizada seja a da ‘Grândola, vila morena’, outras ressurgirão por estes dias nas idas ao baú das memórias… Alguns dos intérpretes já desapareceram, mas as ideias quase subjazem em bastantes dos episódios a relembrar. Pena é que uns certos se tentem apropriar de algumas das canções como se fossem património da sua ideologia ou pretendam reivindicar aquilo que faz parte quase da história destes cinquenta anos de ensaio para a democracia.

3. Os mais novos ainda creem nos ideais abril?

Dizem certas sondagens – divulgadas por ocasião das últimas eleições – que os mais novos se sentem algo alheados dos princípios do ’25 de abril’ e como que se sentem escusados de fazerem parte daquilo que não pediram ou que lhes foi dado sem para isso serem-tidos-nem-achados. Não estaremos a incorrer no mesmo erro quanto à difusão/exaltação da implantação da república em 1910? Uns tantos saudosistas cultivam essas razões e os outros deixam-nos fazer uma certa figura quase ridícula de exaltação de algo distante. Se repararmos a maioria dos dirigentes dos partidos – valha-nos a referência aos que têm assento parlamentar – nasceu depois da ‘revolução de abril’. Não fosse a ‘catequização’ ideológica e ruiria a celebração e as suas simbologias, como o do cravo ou a das velhas chaimites… Será que o país evoluiu ou fossilizou? Houve capacidade de envolver todos ou preferiram fechar-se nas suas bolhas ideológicas?

4. Portugal, que futuro?

Nas vésperas do desencadear histórico da mudança, em 1974, saiu um livro intitulado – ‘Portugal e o futuro’ de um estratega da cúpula da revolta. Hoje podemos e devemos colocar a pergunta de outra forma: Portugal terá futuro, se continuarmos a extremar posições e a preferir mais o que divida do que aquilo que nos une? A quem interessa a visão maniqueísta – nalgumas situações quase maquiavélica – entre uns que são bons porque pensam como eu e outros são maus porque não alinham nas minhas ideias? Temos de atalhar esta visão de portugueses de primeira e outros de categoria inferior ou, então, para que valeu o ’25 de abril’?



António Sílvio Couto

Sem comentários:

Enviar um comentário