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sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

Transvazes político-partidários

 


É um novo fenómeno que perpassa pela nossa sociedade: decorridas as eleições autárquicas é bem de ver a flutuação de pessoas – do mesmo partido – para concelhos da mesma cor, mesmo que numa distância razoável, podendo parecer uma espécie de transvaze à semelhança da seca, que por agora grassa em todo o território continental… As mudanças nem sempre respeitam os que lutaram pela derrota dos anteriores e não veem agora recompensado o seu esforço…

 1. Esta política de transvazes era conhecida entre autarquias ligadas a uma tal esquerda – defensora dos ‘trabalhadores e do povo’ – onde um presidente era técnico superior (como quadro) noutro concelho e, quando não era eleito, por exemplo como vereador, logo era acolhido numa outra instância da mesma coloração e a curta distância… Assim já se via a dança de pessoas e de pelouros ao sabor do que mais convinha, desde que servisse para manter a superioridade (dita) sociológica, mesmo que não fosse mais eleitoral…A rotação das peças era gerida a contento e, nalguns casos, gerada em contentamento…pensavam eles!

 2. Este mecanismo de transvaze como que explica que vejamos pessoas como assessores numa autarquia e passados breves tempos surjam como candidatos ou chefes noutras ao lado…e, casos há, até já fora do mesmo partido. Cresce, então, a sensação de que há uma nomenclatura que governa, conduz e até alicia para que se pense ser tudo igual ou ao menos com aceitação tácita. Temos vivido neste ambiente nas últimas quatro décadas e com uma naturalidade tal que destoar parece ofensivo e/ou antidemocrático.

 3. Ao tomarmos conhecimento deste puzzle percebemos as expressões populares: são todos iguais; só mudam as moscas; é uma questão de chegar ao poder; se queres conhecer o vilão, põe-lhe o pau/mando na mão; não peças a quem pediu nem sirvas a quem serviu…Numa palavra: a diferença não está nas políticas, mas nas pessoas, pois são estas que executam aquelas. Com efeito, o nível e a qualidade tem vindo a decrescer a olhos vistos, dado que, cada vez menos, vemos pessoas a pensarem nos outros, mas antes a olharem para si e para os seus interesses. Se acontecer algo ou aparecer alguém que não seja deste modo, será de acolher, aceitar e de ajudar a ser isso que pretende: estar ao serviço e não a servir-se…

 4. Um exemplo de transvaze sociopolítico surgiu nas recentes eleições: por ‘acordo entre todos’, os partidos concorrentes aceitaram que os votos dos emigrantes – só no círculo da Europa – que não fossem acompanhados da respetiva identificação do eleitor poderiam ser aceites…e misturados com outros que tinham cumprido a lei. Descoberta a ilegalidade é preciso repetir o ato eleitoral.

Digamos que aqueles que fazem as leis, os deputados, são os primeiros a incumpri-la, estaremos na proporção dessa ideia de colocar a raposa de guarda à capoeira… A imagem não foi colocada ao acaso, mas poderemos, assim, compreender, que o local da discussão da democracia é isso mesmo: posto onde uns tantos se consideram galos e outros franganitos à mistura com galinhas e pintainhos mais cordatos e submissos… numa espécie de capoeira nem sempre alinhada com os interesses nacionais mínimos.

 5. Agora que foi anunciado o desagravamento da maior parte das medidas anti-covid, parecem emergir ideias de que tudo vai voltar a ser igual. Por certo isso não seria sério considerá-lo, pois, decorridos dois longos anos de sofrimento, temos de aprender a estar no trato – convívio, contato, confraternização, etc. – uns com os outros. Tendo em conta períodos anteriores desta pandemia como que soa a má organização, deficiente programação ou razoável manipulação quanto foi (mais uma vez) anunciado… Agora que têm maioria governativa falem mais verdade, não iludam com trejeitos de conveniência, pois quem engana facilmente perderá a ilusão quase-ditatorial. Façam o transvaze da liberdade, sem deixarem de não pensar que nunca se descobrirá as manigâncias mais subtis…

 

António Sílvio Couto

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