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sábado, 3 de março de 2018

De novo o esbanjamento?


O mercado de bens de grande consumo caiu cerca de 3% do seu volume, sendo que o setor da alimentação em casa é um dos mais afetados no último ano, com as compras em supermercado a terem uma queda bastante significativa…

Se o (apelidado) tempo de crise levou a que as pessoas deixassem tanto de comer fora, mais recentemente, sete em cada dez pessoas acreditavam que, se o poder de compra aumentar, comer fora poderá voltar a ser uma opção, notando-se, assim, que houve hábitos que não ficaram desse tempo de austeridade…

Não está em causa cercear qualquer direito das pessoas e das famílias, de modo mais abrangente, mas bastou um pequeno sinal de alívio – dizem que financeiro, mas não se sabe se é mesmo económico! – para que fossem retomadas práticas – no todo ou em parte – de per si reveladoras de que uma franja razoável da população não vive nem cultiva a poupança, antes prefere viver como se não haja amanhã… 

= Questões a colocar: comer fora é bom ou menos mal para a família? Comer fora fica mais barato ou mais caro à bolsa dos portugueses? As casas são lares de vida familiar ou espaços de circunstância para o resto da vida social? Haverá algum projeto ideológico para fazer com que a família não se reúna, em casa, à hora da refeição? Não estaremos a ser vítimas e réus de projetos arquitetónicos de casas pequenas e sem espaços de convívio suficientes? A cultura dalguma vida social não estará enferma de certos valores não-cristãos? Estarão os cristãos em geral e os católicos em particular preparados para refletirem sobre a importância/sacralidade da família e da casa em especial?

Não basta lamuriar-se sobre o estado da família. De facto, o leite derramado – sobre o qual dizem que não vale a pena chorar – é digno de ser atendido, pois do seu desperdício poderá ser colhido algo mais do que tristezas e resignações. Com efeito, fomos deixando correr como irremediável a situação da família, criando condições para que esse santuário da vida e da comunhão seja infetado de muitas bactérias e de bastantes vírus capazes de enganar os mais pretensos avisados… 

= Voltamos a uma estória com laivos de incidência moralista por entre tiques de algum humor e a possibilidade de ser oportuna. É, de novo, a visão de três coisas que têm sido suficientemente vulgarizadas e dadas como ‘naturais’ na nossa cultura e na vida da maior parte das famílias.

Quais são três objetos/situações – quais parábolas hodiernas – a que nos habituamos e quase não dispensamos no nosso dia-a-dia? As fraldas descartáveis, o micro-ondas e a aspirina. Explicando: 

* As fraldas descartáveis são uma espécie de símbolo do’ usa-e-deita-fora’, pois só têm utilidade uma vez… Mais do que um objeto, nas fraldas descartáveis vemos tantas outras situações de vulnerabilidade e de efémero com que nos debatemos cada dia…desde que nada atrapalhe a rapidez e velocidade do tempo!  

* O micro-ondas é uma espécie de modelo-do-sem-tempo, do fazer rápido e da falta de amadurecimento das coisas…mesmo da alimentação. Já não há paciência para cozinhar, com condimentos que dão sabor e que testemunham a dedicação aos outros. Comprar pré-cozinhado ou já feito como que resolve a pressa, mas nem sempre dá conteúdo e sabor àquilo com que, dizemos, nos alimentamos. Com que facilidade se transformam a mesa de família e mesmo a cozinha em espaços frios e sem calor humano ou de presença humana e humanizante… Nem a ida ao restaurante – sobretudo se se tem meios económicos ou financeiros – poderá suprir a necessidade de partilha em família e como família… Mal vai uma família se fizer da mesa de refeição um mero espaço de mostrar-se ou de frieza das relações…Isso mais ou mais cedo acabará!

* A aspirina e os seus parceiros analgésicos de luta contra a dor como que nos dão a aferição ao modo como enquadramos a dor e o sofrimento na nossa vida e como isso mesmo é visto e vivido pelos outros e com os outros. A maleta dos analgésicos é hoje quase um adereço como outros o foram no passado – espelho, pente/escova, lenço de assoar ou qualquer outro – em ordem a combater a mais pequena maleita, desde que isso não nos faça ficar achacado e limitado na vida pessoal e social…

Podemos andar com pressa – dizem que é stress! – mas não podemos confundir os factos com a história e esta escreve-se com pessoas, através de gestos e com amor, feito de presença, com ternura e em amizade!

 

António Sílvio Couto  


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