Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



segunda-feira, 5 de março de 2018

Um festival algo fatela?


Já foi tempo em que o festival da canção – de apuramento para escolher um representante para a eurovisão – era um acontecimento relevante no panorama dos espetáculos no nosso país… Com os resultados miseráveis de mais de cinquenta anos lá fora, foi caindo o interesse cá dentro. Com a vitória inesperada, no contexto europeu, o ano passado do nosso concorrente, quiseram dar novo impulso a este festival, tanto na criação, como na visibilidade do dito…sem que isso tenha gerado grande entusiasmo…para além do círculo por onde se movem esses interesses e vivências musicais.

Por várias razões não vi nada das pré-seleções para aquilo que foi feito no domingo passado, apurando as catorze canções, de onde foi selecionada a nossa representante para o festival da eurovisão e realizar, em Lisboa, em meados de maio. O meu interesse foi muito pouco ou quase nulo, embora tenha assistido à declaração de vitória de quem se impôs ao resto da concorrência… Foi como não ter visto o desenrolar do ‘jogo’ e tenha colhido o resultado final, sem ter sabido como decorreu a ‘batalha’… tentando adivinhar os ‘meandros’ das conclusões derradeiras!

As palavras colocadas entre aspas – jogo, batalha e meandros – formam como que uma explicação para o uso do termo ‘fatela’ com que se titula este texto, sob a tónica da interrogação. Com efeito, na linguagem mais ou menos juvenil, fatela tem a ver com algo que não tem qualidade nem requinte ou bom gosto…andando a roçar o pimba, rasca, foleiro ou pindérico… Se acrescentarmos a este termo fatela as três palavras que referimos – jogo, batalha ou meandros – estaremos como que a fazer uma avaliação ao dito festival, onde parecia que se vivia um jogo do qual as regras estavam relativamente inquinadas – veja-se as tricas com uma das canções, acusando-a de plágio – numa batalha nem sempre lisa e sincera por todos os competidores, fazendo com que os diversos meandros se possam tornar suficientemente obscuros para a maioria do povo… 

= Porque será que as canções levadas aos festivais, mesmo as vencedoras, não fizeram grande sucesso entre o público consumidor de música, sobretudo daquele género, dito um tanto ligeira? Porque será que os maiores vendedores de música popular ou outra nem sempre concorreram ao dito festival da canção? Será coincidência ou foi um percurso assumido esse de os cantores/as mais populares fugirem da prestação de provas no festival da canção? Não haverá algo de ideológico – sabemos como a música é veículo de difusão – em muitos dos concursos de festival?

Apesar de ser uma cançãozinha de embalar – com o título ‘jardim’ – a vencedora deste ano terá estaleca para vingar nas lutas que tem de enfrentar? Será que a máquina posta à disposição do vencedor do euro-festival do ano passado vai estar disponível para este ano? Até que ponto seremos levados a sério pelo mundo do cançonetismo – tal como já aconteceu no futebol e noutros campos – por forma a não parecer que a vitória de 2017 foi mais do que uma confluência de bons desempenhos, mas sem continuação? 

= Há momentos da nossa história coletiva recente que nos fizeram quase acreditar que algo de bom se evidencia, quando tem a intervenção de portugueses. Não há dúvida, quando temos condições, estamos entre os melhores, tanto da Europa, como para com o resto do mundo. Temos vindo a aprender com muitos dos nossos falhanços, pois o sucesso precisa de programação, de trabalho, de execução, de avaliação e, sobretudo, de dedicação. Quando estes itens são percorridos vemos que ombreamos com os que ganham admiração pelo mundo além…

Nesta fase de competição de todos contra todos, podemos considerar que ‘amadorismo’ não pode ser contraposto a profissionalismo, mas o dito amadorismo pode e deve consubstanciar a capacidade de dedicação, de vivência em amar aquilo que se faz com convicção e de referência à suplantação das nossas limitações pela entrega às causas e, sobretudo, pela união de esforços em vencer…Assim se pode explicar que tantos/as portuguesas estejam entre os mais galardoados nas áreas científicas, tecnológicas, desportivas, de performance em campos que julgávamos inatingíveis…

Temos de nos nivelar pelos mais capazes, deixando de nos bastarmos com medalhas de consolação e, tantas vezes sem nexo, com essa doença coletiva nacional da resignação. Se nos unirmos havemos de vencer!...   

 

António Sílvio Couto

Sem comentários:

Enviar um comentário