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quarta-feira, 12 de novembro de 2014

O ‘muro da vergonha’ ainda tem defesa?


Por estes dias ocorreu o vigésimo quinto aniversário da queda do ‘muro de Berlim’, que associado à cortina de ferro entre o mundo comunista e a sociedade ocidental, na Europa, representaram o ‘muro da vergonha’. Tudo isto aconteceu em 1989: ano simbólico de uma nova etapa da cultura de liberdade, de solidariedade e de comunicação.

Tive, em 1986, a grata possibilidade de ter estado uma semana em Berlim… recebendo informações políticas e sociais e vivendo na prática o garrote da ‘liberdade’ de Leste… onde o semáforo do homem a marchar era um símbolo mais do que decorativo do lado de lá do muro, pois representava a militarização patente em tudo, mesmo nos pormenores de trânsito e no mais subtil controlo dos movimentos dos ‘invasores’ ocidentais…

Voltei, cerca de dez anos depois, a pisar o solo berlinense e vi as cicatrizes nas ruas e nas mentalidades. À época de 1996, Berlim (antiga leste) estava invadida de guindastes, de obras de reconstrução e de trabalhadores emigrados portugueses, que, nessa tarde de outono dominical, em que os vi, se refugiavam nas estações de caminho-de-ferro, abrigados do frio quase glaciar…

Foram dois momentos muito sentidos da minha passagem por Berlim, onde pude perceber que nesta parte ocidental da Europa, que é Portugal, vinte e cinco anos depois, ainda podemos encontrar defensores daquele ‘muro da vergonha’ – como dizia, por estes dias, um jornal partidário para salvaguardar dos ataques dos intrusos – mesmo que, se eles até foram visitantes ocasionais, escaparam às filas para comer ou se serviram de outros mercados para serem atendidos… Não entendo onde têm estado ou por onde têm andado certos apaniguados do regime marxista: a liberdade parece ser só é importante, se for a deles! Não percebo como pode haver quem lhe custe fazer um processo de reformulação, se ainda não entendeu a desadequação das ideias com a prática! Há, de verdade, ideologias que são tão fixistas que nem entendem que o mundo avançou, embora usufruam das regalias do avanço económico e social, mas esconjurem os seus mentores!

Vamos tentar refletir sobre três (entre tantas) das ideias que motivaram, que mobilizaram e que construíram o novo mundo saído da revolução de 1989.

Na encíclica de João Paulo II, ‘Centesimus annus’, números 22 a 29, faz-se uma análise muito profunda sobre o significado desta data de 1989 – repare-se que são dois séculos precisos após a revolução francesa – destacando-se a falência económica do sistema coletivista/comunista, o vazio espiritual provocado pelo ateísmo, a recuperação da liberdade individual e a sua expressão política na sociedade… em vista de um desenvolvimento integral da pessoa humana, onde Deus tem lugar e a vivência da liberdade religiosa é fundamental.

- Cultura de liberdade – sentido profundo e essencial da pessoa, onde cada um é tanto mais livre quanto mais viver desapegado de tentáculos materialistas. Com efeito, não basta substituir os paradigmas – de marxista para consumista – para que tenhamos já uma consciência correta da liberdade tanto pessoal como comunitária… O caminho ainda não foi iniciado!

- Cultura de solidariedade – é digno de registo que até ao início da década de 80 do século passado era difícil encontrar um registo digno de mais do que poucas linhas deste termo ‘solidariedade’… Muito por influência de experiências sindicalistas – algumas rebeldes anticomunistas – foi possível perceber que a solidariedade era e é um conceito de amplitude mais profunda do que a fraternidade da (velha) revolução francesa…

- Cultura de intercomunhão - agora os direitos de todos que têm lugar na intercomunhão de povos, culturas, línguas e religiões… nesta globalização de ideias e (até) de temores. Veja-se o que acontece nalguma das vagas de doença, em que como que todos ficam em risco, mesmo que remoto.

 

O muro da vergonha pode ainda subsistir no nosso coração e na conduta de tantos dos nossos contemporâneos. Assim saibamos derrubá-lo em nós e à nossa volta!

 

António Sílvio Couto

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