Fruto das circunstâncias sócio/económicas vivemos, hoje,
uma espécie de exploração da condição de ‘pobre’: uns porque se fazem passar
por tal situação e com isso vão equilibrando a vida; outros porque atentos ao
fenómeno dos pobres deles se aproveitam para surgirem como beneméritos de
causas sociais mais ou menos ideológicas; outros ainda porque, sabendo as
brechas da aferição ao verdadeiro significado de ‘pobre’, jogam conforme as
circunstâncias com a representação do ‘pobre’ e o usufruir da negligência do
controle sobre a exploração do que se quer e das pretensões nas conquistas…
Defender os ‘pobres’ ainda vai captando (mais ou menos) a
atenção duma boa parte da população… seja porque se revê no epíteto, seja porque,
ideologicamente, isso favorece sê-lo nem que mais não seja por não (a)parecer…
nas estatísticas e nas leituras políticas.
Só, em Portugal, um por cento dos habitantes acumula a
riqueza equivalente a 25% do resto dos (ditos) cidadãos. Assim sendo, ser ‘pobre’
parece que mais vale parecê-lo do que sê-lo… pois aquela vertente tem
mais-valias que esta nem sempre conquista… ao menos a curto prazo.
Alguns dos setores da nossa dimensão coletiva vivem muito
da real ou ficcionada apresentação do ‘pobre’. Como dizia, recentemente, um
comentador jornalístico: alguma esquerda ralha com os ricos, enquanto a Igreja
católica trata dos pobres. De fato, não fossem tantas e tão diversificadas
ações de várias entidades e associações da Igreja (sobretudo católica, mas muitas
outras de teor cristão) em favor dos pobres – sobretudo dos da relação de
proximidade – e essa onda de excluídos seria ainda mais acentuada… desde a
reivindicação até ao aproveitamento, passando pela circulação de expedientes de
exposição da dignidade mínima de pessoas e de famílias até à proliferação da
pobreza psicológica e emocional.
= Pobres sempre os
tereis convosco!
Nos tempos mais recentes temos ouvido – ou melhor tem
sido dado eco – múltiplas e insistentes afirmações do Papa Francisco a reportar-se
à necessidade de irmos ao encontro das periferias onde se encontram tantos dos
pobres dos nossos tempos.
Sem reduzir o conceito de ‘pobre’ à dimensão material,
temos ainda escutado o Papa a denunciar o aproveitamento duma certa franja
comunista da temática dos pobres, sem deles mais não terem feito do que
espicaçarem as suas debilidades com denúncias e reclamações, azedumes e
animosidades…
Francisco sabe do que fala e tem condições para ensinar,
pois ele mesmo se tem feito pobre na condição dos empobrecidos, isto é,
despojando-se das categorias heráldicas e dos penachos de comando…
De fato não basta levantar a voz em denúncia, é preciso
sujar-se com aqueles que são o alvo da nossa visão e da vivência profética,
pois a Palavra tem de ter em nós e à nossa volta consequências de compromisso e
não só de utopia e de idealismo.
= O verdadeiro pobre é e tem de ser cada um de nós, na
perspetiva da sua vida e na condução da sua existência, pois pouco basta para
vivermos com o mínimo de dignidade e de conforto. A ‘qualidade de vida’ é tão
subjetiva que uma pequena dose de Evangelho pode mudar a nossa mentalidade e o
nosso comportamento… radicalmente.
= Muitos dos pobres são pessoas fragilizadas pela falta
de sentido para a vida… mesmo que pareçam ter sucesso económico e razoáveis
proventos de sobrevivência…quantas vezes, estão tristes e empobrecidos em seu
interior quase oco e vazio.
= Outros pobres precisam de serem elevados na
dignificação humana e cultural, aprendendo a pensar por mesmos, a saberem
conduzir-se por critérios e valores éticos que coloquem os outros no centro e a
não si mesmos num fechamento egoísta e hedonista.
= A melhor e mais autêntica forma de combater a pobreza é
a de dar às pessoas ferramentas para saberem conduzir-se segundo o que há de mais
autêntico: a dedicação aos outros e ao serviço destes como presença em amor por
Jesus, com Jesus e para Jesus… Ele o ‘Pobre’ por antonomásia, mas o mais livre
de todos porque desapegado das ligaduras materialistas. Com Ele venceremos a
pobreza, seja ela de que natureza for!
António
Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)
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