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sexta-feira, 11 de julho de 2014

Padre, algo (humanamente) descartável!


Neste tempo de verão – nada tem de simbologia dos frutos amadurecidos e/ou em maturação – vemos (ainda) surgirem nas notícias – sobretudo em circuito interno – dos jornais diocesanos que há ordenações de padres…um pouco por todo o lado. Já não na quantidade de outras épocas e talvez nem sequer na qualidade de tempos de cristandade… Mas, aqui e acolá, ainda há padres (e nalguns casos até bispos) que são ordenados… para o serviço do povo de Deus, na sua concretização em Igreja católica.

Sem querer fulanizar – como agora se diz, quando se pretende falar de um caso, extrapolando para o conjunto dos outros – em ninguém, parece-me que o ministério sacerdotal está muito fragilizado, tanto na aceitação como na prossecução do mesmo em terreno do mundo.

Já passou o tempo em que o padre – fosse qual fosse o atributo ou a função e até mesmo a condição de exercício – era considerado uma figura social e quase culturalmente de destaque. E, nem sequer, a veste eclesiástica, lhe dá, hoje, estatuto de proeminência cultural e figuração social… antes pelo contrário. Pois, se se quiser ridicularizar um padre, a vestimenta (tanto da batina como do colarinho) surge como involucro de chacota e/ou de riso…do povo ou, sei lá, da suspeita de ser ou não ser, de verdade!

Não é ainda habitual que alguém como padre – sobretudo se faz uma a autoavaliação – seja bem entendido se questiona a forma e um tanto o conteúdo do seu exercício ministerial ordenado… Ainda há uns meses tive a ousadia de escrever sobre alguém (padre em exercício) que estava em pré-desânimo e, logo, surgiram suspeitas sobre a possibilidade de estar em crise, tanto de âmbito pastoral, quanto de identidade…Ora, se isto acontece com aqueles que pensamos que estão na (nossa) onda e nalguma proximidade, quanto mais poderá ocorrer com quem não é capaz de sintonizar o que quer que seja ser padre… num mundo mundanizado, nos critérios e na conduta.

Por estes dias, se Deus quiser, completarei trinta e um anos de ordenação sacerdotal. Não é muito tempo, mas já é algum; não é uma data redonda de jubileu, mas pode ser oportunidade acrescida de dar graças a Deus e de Lhe pedir perdão; não significa muito, mas poderá representar bastante… na aferição ao projeto divino e à sua concretização na realidade humana de cada lugar e de tempo.    

Neste contexto, sem pretender dar qualquer lição eclesiástica, transcrevo o ‘Decálogo do sacerdote’, apresentado por um bispo alemão já falecido, D. Klaus Hemmerle, bispo de Achen, numa jornada de estudo da Conferência Episcopal Alemã:

- É mais importante como eu vivo o sacerdócio, do que aquilo que faço enquanto sacerdote.

- É mais importante o que Cristo faz através de mim, do que aquilo que faço eu.

- É mais importante que eu viva a comunhão no presbitério, do que lançar-me até à exaustão sozinho no ministério.

- É mais importante o serviço da oração e da palavra, do que o das mesas.

- É mais importante seguir e ajudar a formar, espiritual e culturalmente, os colaboradores, do que fazer eu mesmo e sozinho o mais possível.

- É mais importante estar presente em poucos, mas centrais sectores de ação, com uma presença que irradie vida, do que estar em tudo à pressa ou a meias.

- É mais importante agir em comunhão com os colaboradores, do que sozinho, mesmo que me considere capaz; ou seja, é mais importante a comunhão do que a ação.

- É mais importante, porque mais fecunda, a cruz do que os resultados muitas vezes aparentes, fruto de talentos e esforços simplesmente humanos.

- É mais importante ter a alma aberta sobre o “todo” (comunidade, diocese, igreja universal, humanidade), do que fixada em interesses particulares, ainda que me pareçam importantes.

- É mais importante que a fé seja testemunhada a todos, do que satisfazer todos os pedidos habituais.
 

Padres, irmãos no sacerdócio, tentemos rever-nos com humildade diante de Deus e dos outros, pois Aquele defende-nos, mas estes, na hora da verdade, falham e desertam… ontem, como hoje e amanhã!

 

António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)

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