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domingo, 9 de agosto de 2015

Tibieza recorrente, hoje

 «Conheço as tuas obras: não és frio nem quente. Oxalá fosses frio ou quente. Assim, porque és morno – e não és frio nem quente – vou vomitar-te da minha boca» (Ap 3, 15-169.
Hoje é muito pouco comum falar-se de tibieza. Se procurarmos nalgum índice analítico de documentos recentes da Igreja – por exemplo: Catecismo da Igreja Católica, textos do Concílio Vaticano II… temos alguma dificuldade em encontrar referências explícitas a este termo, podendo surgir o seu contrário ‘zelo’ e questões afins… Explicitamente falta algo sobre esta matéria!
Há quatro ou cinco décadas atrás era muito habitual vermos variadas anotações ao tema da tibieza, seja nos sinais da mesma, seja nas causas e, sobretudo, nas consequências duma vida cristã tíbia ou morna, deixando correr ou mesmo vivendo no ‘faz-de-conta’ e na vulgaridade das atitudes para com Deus, para com os outros (particularmente na vivência em Igreja católica) e até cada um para consigo mesmo…

= Mas será correto enfrentar a tibieza se, à nossa volta e em nós mesmos, vemos que tudo nos puxa para o mais fácil? Não se poderá correr o risco de ser considerado fanático se se destoa da maioria… dentro ou fora do quadro da Igreja católica? Perante esta forte onda de desmotivação (social, pessoal, familiar e mesmo eclesial), não andaremos ao ritmo da tibieza (quase) institucionalizada? Não viveremos todos numa falta de ardor tal que o melhor será deixar correr… para ver para onde isto (nos) leva? Quem ousará correr o risco de incomodar tantas consciências acomodadas ao ‘bem-bom’ quotidiano? Não será que, por vezes, é mais fácil atirar as responsabilidades para os outros sem nos deixarmos inquietar minimamente, seja com o que for? Tudo isto não estará a pôr a nu a falta da verdadeira profecia, nalguns casos, confundindo-a mais com reivindicação e até com a mera denúncia? Afinal, não será a tibieza uma definição da cultura que temos estado a criar, a cultivar e a viver?

= Cultura em modus vivendi
Quem melhor do que Santa Teresa de Ávila – no quinto centenário do seu nascimento – para nos falar da tibieza, como estado de alma e/ou atitude de vida?
«Passei nesse mar tempestuoso quase vinte anos, ora caindo, ora levantando. Mas levantava-me mal, pois tornava a cair. Tinha tão pouca perfeição que, por assim dizer, nenhuma conta fazia dos pecados veniais. Se temia os mortais não era a ponto de me afastar dos perigos. Sei dizer que é uma das vidas mais penosas que se possa imaginar. Nem me alegrava em Deus nem achava felicidade no mundo. Em meio aos contentamentos mundanos, a lembrança do que devia a Deus me atormentava. Quando estava com Deus, perturbavam-me as afeições do mundo. Com o auxílio da graça, é possível sair da tibieza e passarmos da condição de frios e temerosos a fervorosos no Espírito» (Santa Teresa de Jesus, ‘Vida’ 8, 2).

Sem nos darmos totalmente conta, vivemos numa cultura cujo modo de ser e de estar é uma espécie de mediocridade, onde a apatia, o desânimo, a indiferença, o ‘tanto-vale’, a moleza, a frieza (nas relações com Deus e mesmo uns com os outros), um certo desprezo até para com os que nos são próximos fazem carreira na vida e no comportamento de muitas (diríamos, demasiadas) pessoas. E, pior, isto está alojado em nós mesmos – como se fosse um vírus letal – que nos faz, na maior parte dos casos, acusar os outros, mas a doença está em cada um de nós…
Mais do que receitas para os outros, precisamos de fazer o diagnóstico sobre nós mesmos e aceitarmos que vivemos em estado de tibieza muito galopante, incapazes de ver os sinais mínimos de Deus na nossa vida. Assim se poderá explicar a desmotivação em (não) participarmos nos projetos da Igreja universal, na vivência das dioceses e nos aspetos recorrentes das paróquias. É contra este estado de tibieza que temos de lutar em força e na força do Espírito Santo. De facto, foi Ele quem investiu os discípulos temerosos e tíbios, na manhã do Pentecostes, em anunciadores da Ressurreição na força de Jesus.
Tal como o profeta Ezequiel (Ez 37,1-14) queremos suplicar ao Espírito Santo que sopre sobre este montão de ossos ressequidos e os faça reviver como exército do amor de Deus, na esperança e na coragem!

António Sílvio Couto

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