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terça-feira, 14 de janeiro de 2020

‘Simili modo’ (do mesmo modo, igualmente)


Esta expressão –‘simili modo’ – aparece-nos em vários momentos bíblicos e litúrgicos, numa referência de comparação entre algo transcendente e a nossa condição terrena, bem como na tentativa de incluir em linguagem humana aquilo que os nossos limitados sentidos vão conseguindo atingir, observar e almejar.

Ora, nas múltiplas incidências da nossa vida poderemos tentar analisar diversas situações ‘simili modo’ como se fôssemos ou deixássemos de ser algo que nos possa ter empenhado na vida, sobretudo numa envolvência militante, apaixonada (muito para além do sentido meramente emotivo/sentimental) e, particularmente, como ideal de toda uma vida.

= Trazemos a esta reflexão duas questões um tanto sensíveis e aparentemente díspares, não só pela sua complexidade como sabendo que podem atingir situações mais próximas senão mesmo personalizadas. Refiro-me ao tema do celibato sacerdotal e à ‘conversão’ possível de certos (ou de todos?) os militantes marxistas. Sobre o celibato sacerdotal citamos algumas frases – porque expurgadas por outros serão em recurso alheio – do Papa emérito Bento XVI. Quanto à pretensa mudança ideológica dos citados lançarei breves perguntas de sugestão que são um tanto mais do que suposições…

* Num livro escrito em parceria com um cardeal (prefeito da congregação para o culto divino e disciplina dos sacramentos), Bento XVI (de seu nome teológico José Ratzinger) não deixa de se pronunciar – clara, distinta e simplesmente – sobre o celibato sacerdotal, dizendo: ‘acredito no celibato’ dos sacerdotes, pois este ‘tem um grande significado’ e ‘é indispensável para que o nosso [o dos padres, em primeiro lugar] caminho na direção de Deus permaneça o fundamento da nossa vida’. Em jeito de advertência e numa quase lição testamentária, Bento XVI refere que ‘é urgente e necessário que todos – bispos, padres e leigos – parem de se deixar intimidar pelos apelos mal direcionados, pelas produções teatrais, pelas mentiras diabólicas e pelos erros a moda que tentam derrubar o celibato sacerdotal’.

Num tempo em que muitos – a maioria segundo conceitos mais de sabor mundano do que com visão cristã esclarecida, amadurecida e comprometida eclesialmente – discutem o tema do celibato sem que isso lhes diga respeito, é essencial que nos fixemos naquilo que é importante e não deixemos que interesses mais ou menos maquiavélicos preencham a ignorância de uns tantos na Igreja. Nunca por nunca ordenar homens casados –como foi de forma excecional sugerido no sínodo sobre a Amazónia – suprirá a acentuada falta de padres na Igreja católica. Se isso fosse a solução muitas das igrejas protestantes e até ortodoxas não teriam a mesma (ou maior) crise de vocações ao ministério sacerdotal.

É uma questão de vocação e não de mera conveniência de serviço. Digo-o de forma convicta e sem pretender reclamar qualquer ‘compensação’, se alguma vez algo se puder modificar. Foi conscientemente assumido. Ora, sobre este tema já escrevi, por ocasião dos vinte e cinco anos de padre, uma reflexão que cito como exemplo: ‘Dom e carisma de ser padre’, Prior Velho, Paulinas, 2008, pp.136-142.

* Poderá um marxista – comunista, socialista ou trotskista – convicto mudar a sua posição – na maioria das vezes a sua pretensa opinião – sobre tantos dos temas identitários da sua luta? Os clichés – luta de classes, capital/capitalismo, exploração, mais-valias, povo, trabalho/trabalhador – em que se ancora terão ainda lugar na política atual? A incapacidade para passar à prática as ideias dialéticas não faz abrir os olhos para a inconsistência/falhanço das mesmas? O empobrecimento social e económico dos países e das populações não fez perceber que a ditadura popular não criou democracia? O regime que criou mais vítimas (milhões em todo o mundo e desterrados às miríades) no século passado ainda merece confiança, hoje? A violência e discriminação sobre os que não eram da ideologia, não fez perceber a injustiça das ideias e há quem as defenda e vote, na atualidade? Certas posições autárquicas não serão de um certo marxismo capitalista?

Eis algumas das perguntas que fizeram uns tantos libertar-se das peias do marxismo, deixando-o como regime e quase religião ateia. Muitos dos testemunhos interrogam porque levou tanto tempo a compreender a farsa em que viveram… Muitos/as dos recauchutados/as perderam anos ou ganharam novo sentido de vida?

= Do mesmo modo que para muitos dos nossos coevos é de difícil compreensão o ‘mistério’ do celibato sacerdotal, tal é a erotização da sociedade, assim tenho algum resquício de incompreensão para com regimes que tão nefastos frutos deram para com a história da Humanidade recente…sem arrependimento percetível.

 

António Sílvio Couto

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