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sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

‘Irritação’ do Papa – compreensão ou não-desculpa?


Percorreu a comunicação social – agora diz-se: de forma ‘viral’ – um gesto de alguma irritação do Papa Francisco para com uma senhora – dá impressão que era de aspeto oriental – que o tentou reter, por ocasião da sua passagem junto das barreiras do público, antes da celebração no último dia do ano passado…

Isso que aconteceu foi de tal forma desagradável que o próprio Papa pediu desculpa pública, na oração de Angelus do primeiro dia do ano, por ter perdido a paciência para com aquela senhora – seria fiel ou provocadora? – no dia 31 de dezembro passado.

As reações foram tão díspares – ou seria melhor dizer disparatadas – que talvez seja útil colocar alguns pontos de ordem à nossa reflexão humana, cristã, católica e mesmo papal.

Os títulos e os comentários roçaram alguma menos boa aceitação sobre o gesto/atitude/reação do Papa Francisco. ‘Papa irrita-se com mulher e dá-lhe palmada na mão’; ‘Papa irrita-se com mulher que lhe agarrou a mão’; ‘Papa Francisco bate na mão de mulher que o tentava puxar’… eis alguns dos títulos das publicações escritas por cá.

Há quem coloque o incidente sob a alçada da menos boa atuação da segurança para com o Papa com os inerentes riscos de ele se aproximar em excesso das multidões e de nem sempre ser atalhado que algo pode acontecer de imprevisto senão mesmo de atentado.

Embora reconhecendo que foi um mau exemplo por ter perdido a paciência, o Papa Francisco tão popular e excessivamente próximo de quantos dele se abeiram poderá intentar uma nova forma de se dizer próximo sem proximidades arriscadas…

Recordo a comunicação que ouvi, em Fátima, de António Spadaro – um jesuíta italiano com boa reputação desde o Vaticano – que comparava os dois últimos papas e os seus gestos: Bento XVI não alargava os braços perante as multidões mais do que a abrangência dos ombros, como bom alemão circunspeto que era e que é; enquanto Francisco exprimia a sua relação com as multidões abrindo o mais amplamente que podia os braços…à boa maneira da América Latina. Ora, sete anos depois de ter chegado à cátedra de Pedro, Francisco revelou este simples incidente no trato com as multidões que o cercam. Isto é mais do que um problema de segurança, poderá (e deverá) servir para rever o modo de estar com quem o procura, isto é, próximo mas sem exageros… para que não se tenha de retrair no modo de estar, condicionando a forma de ser…

Este episódio com o Papa não poderá deixar tudo na mesma, pois não pode ser interpretado como uma grande ofensa nem como algo de somenos interesse. O Papa Francisco é humano e pode reagir de forma menos correta. Por outro lado, não foi tudo deitado a perder sobre o que ele tem feito, dito ou atuado… ao longo de mais de oito décadas de vida, se bem que as últimas sete tenham sido mais sob os holofotes da comunicação social. Ter compreensão para com uma reação mais irritadiça não faz com que o Papa seja considero rude ou menos bem-educado. Também podemos e devemos considerar que, por vezes, há pessoas que não sabem respeitar os limites de aproximação aos outros, sobretudo àqueles que ocupam lugares de algum relevo humano ou social. Saída do anonimato a dita senhora talvez venha a tornar-se um alvo de atenção sobre a repercussão daquilo que lhe aconteceu com o Papa possa significar.

Num inquérito de um jornal de grande tiragem sobre o impacto do incidente com o Papa, as respostas situavam-se: dois terços dos que responderam eram a favor do Papa e só um terço aceitando que isso abalava a imagem de Francisco…

Que não seja um momento infeliz de irascibilidade que possa deitar a perder tudo quanto o Papa Francisco tem feito pelos outros, inclusive por aqueles que, de tantas e tão variadas formas, o vão detraindo. Queira Deus reconstruir o que algum mal ofuscou…  

 

António Sílvio Couto

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