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terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Eutanásia: suicídio racional?


Ouvi, por estes dias, num programa radiofónico a classificação da eutanásia como uma forma de suicídio racional, onde o sujeito ‘decide’ por si mesmo como quer morrer, ou melhor, antecipar a morte, se considerar que a vida não tem a qualidade que ele considera a mais conforme ao seu desejo…

O tema da eutanásia tinha que surgir na discussão política e – ao que parece – irá se levado à assembleia da república. Quem o propõe tem sido especialista em trazer à liça temas fraturantes mais ou menos ao ritmo da sua oportunidade (ou oportunismo) partidária… Quase sempre esses assuntos têm surgido como recurso de distração, quando as coisas começam a ser menos agradáveis para outros expedientes… Foi assim com o aborto (eufemisticamente apelidado de ‘interrupção voluntária da gravidez’), com o casamento entre pessoas do mesmo sexo (embora entendidas de género diferente), com a adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo (mesmo que sobrepostas em interesses minimamente convergentes), com a procriação (dita) medicamente assistida (embora não passem de ‘barrigas de aluguer’)… e tantos outros fait-divers de ideologias para as quais – ao que parece – a pessoa humana nem sempre tem dignidade ou só a tem quando entra na lógica do (seu) materialismo de vida…

= Discussão, debate, referendo… tudo sem pressas

Colhendo a avaliação de outros assuntos – entre os quais os supra citados – tenho a impressão que há gente que quer fazer deste problema da eutanásia uma solução atrapalhada e rápida, não deixando que tudo seja cuidado no esclarecimento, na discussão séria e serena, tendo uma apreciação – mesmo através do voto popular – num referendo que não precisa de ser realizado a muito curto prazo.

Reportando-me novamente ao programa radiofónico fiquei com a sensação – na sua maioria de mulheres – de que há uma razoável aceitação popular, pela sua implementação para com este tema, se bem que se pudesse notar que as pessoas intervenientes já estariam despertas para se pronunciarem favoravelmente pela eutanásia…

Posteriormente tentei questionar-me sobre esta – real ou empolada – onda pró-eutanásia, inquirindo de mim mesmo: porque se foi tornando tão vulgar ir-se aceitando a (dita) morte assistida? As pessoas já perderam os critérios sobre o valor intrínseco da vida? Até onde irá a justificação sobre o pôr termo à vida a pedido direto ou por outrem? Os sinais de desvalorização da vida humana não estarão a contradizer a luta pela saúde?

= Questões mais do que religiosas ou éticas

Hoje é um tanto vulgar ouvirmos, mesmo no contexto católico: estava a sofrer tanto, ainda bem que Deus o levou? Que mal fez para ter de suportar tanto sofrimento? A vida a sofrer daquela forma, já não é vida! Faltava qualidade de vida do próprio e de quem o acompanhava!

Na formação do cristianismo que foi, em tempos ministrada, a questão do sofrimento até era apresentada como uma forma de purificação, pelo desconto dos pecados pessoais e dos outros, bem como era apresentado o sofrimento em ordem a viver a entrega desses momentos de sofrimento pela conversão pessoal e alheia… como diziam os pastorinhos de Fátima, ‘pela conversão dos pecadores’!

Não será que, ao termos posto em evidência, outras vertentes da fé e da vida cristã, se pode caído num certo depreciar do valor redentor do sofrimento, unido ao da Paixão de Cristo? Continuando a cuidar, cada vez melhor, da saúde, não podemos desperdiçar a força do sofrimento em qualquer das suas dimensões.

Estamos, novamente, a travar uma luta cultural e de civilização. Reduzir isto a questões de legislação poderá subverter o problema, deixando-o à mercê de interesses mais ou menos subterrâneos naquilo que toca ao nosso futuro próximo coletivo. Se as questões do aborto tentaram resolver um problema do passado, a eutanásia lança algumas preocupações sobre o nosso futuro pessoal.

Consta que há países, onde a eutanásia foi legalizada, em que os mais velhos já trazem ao pescoço um aviso: em caso de acidente não me levem para o hospital, pois não quero morrer. Assim sendo, para onde caminhamos?

 

António Sílvio Couto

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