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terça-feira, 26 de maio de 2015

Cidadãos, podemos?



As recentes eleições municipais e regionais, em Espanha, tiveram, na possibilidade de escolha, dois ‘novos’ partidos – Ciudadanos e Podemos – que retiraram mais de dois milhões de votos aos partidos ‘antigos’, criando nalgumas circunscrições eleitorais novos desafios, particularmente, na governabilidade de municípios e regiões.

Embora sejam dois ‘partidos’ à maneira do Syrisa grego – isto é, muitas sensibilidades culturais e ideológicas, aglutinadas à volta da contestação, sobretudo, à austeridade – os ‘fenómenos’ espanhóis revelam-nos uma nova forma de intervir na política nacional, europeia e transnacional.

Deixamos ao interesse de quem se quiser informar sobre aqueles dois partidos ‘novos’ espanhóis, mas queremos servir-nos das duas palavras (com os conceitos que contém) – Cidadãos e Podemos – para tecer algumas considerações sobre a situação político-ideológica dos nossos dias e neste tempo algo fugaz, nebuloso e desafiante.  

1. Cidadãos

Desde logo ‘cidadão’ é aquele que vive na cidade, que foi e é civilizado, que constrói e se compromete com a cidade onde vive e a ajuda a engrandecer...ativa e civicamente.

Cidade contrasta com ‘pagus’ (campo), seja na ruralidade que apresenta, seja na (possível) não-civilização em que pode viver. É dos aspetos cristãos mais básicos esse duma certa oposição de ‘pagão – não batizado nem cristianizado – ao de ‘cidadão’ – aquele que vive na cidade, civilizado e, tendencialmente, batizado, isto é, cristão. Assim, durante muitos séculos, ser cidadão como que equivaleria a ser cristão e pagão seria alguém a civilizar, atraindo às regras da cidade...numa cristandade mais ou menos difusa e difundida.

Ora, particularmente, após a Idade Média, o renascimento, a reforma, o iluminismo, a revolução francesa... foi sendo introduzida uma certa civilização humanista, tendencialmente, não-cristã – senão mesmo anticristã – relegando a cidadania para uma dimensão mais individualista, racionalista e egoísta.

No entanto, cidadania é muito mais do que aquilo que cada um deseja, pois os cidadãos são pessoas em relação com os outros e não meras ilhas justapostas onde os interesses de grupo se impõem ao coletivo, mas também este não poderá ser a soma das simples ideias de contestatários mais altissonantes...como agora podemos perceber. Por seu turno, a cidadania não pode ser intentada contra Deus ou como se Ele não existisse, pois, será, na abertura ao divino, que o humano se valoriza e faz com que os cidadãos se respeitem e cuidem altruística, fraterna e solidariamente.   

2. Podemos

Este termo ‘podemos’ como que nos confere a todos e a cada um a possibilidade de sermos construtores da nossa sociedade, onde cada qual vê os outros olhos-nos-olhos e não em deferência de subalternidade ou em paternalismo de inferiorização. Com efeito, há circunstâncias que nos fazem lutar pela dignificação dos outros e com isso podemos servir num humanismo verdadeiro e sincero nessa linguagem de promoção dos valores humanos e culturais do bem comum, da subsidiariedade, da justiça, da paz, etc.

Numa Europa que vive em paz – em relação ao todo do continente, embora com exceção nalgumas partes (Balcãs e antiga URSS) – há mais de sessenta anos, temos de saber construir uma civilização onde não tenhamos de viver só ao sabor do materialismo pessoal, familiar, de critérios...no coletivo ou no particular.

Não podemos permitir que, depois da cristandade profana, se difunda uma cidadania somente agnóstica, ateia e anticristã. Não podemos deixar que reduzam as Igrejas a interfaces de socorro sem a comunicação de valores espirituais e cristãos. Não podemos continuar a viver numa sociedade anónima sem direito a poder comunicar livremente a razão da nossa esperança e do nosso compromisso político em favor de todos...sem esquecer nem explorar os mais desfavorecidos.

Está na hora de os cidadãos saberem dizer: junto e unidos podemos fazer melhor com a ajuda de Deus e uns dos outros.

 

António Sílvio Couto

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