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segunda-feira, 13 de abril de 2015

Seremos rostos de misericórdia?


O título da bula convocatória do ano santo, que o Papa Francisco apresentou recentemente, é ‘Misericordiae vultus’ (rosto de misericórdia). Deste modo teremos entre 8 de dezembro deste ano – data do encerramento do concílio Vaticano II, há meio século – e o dia de Cristo Rei de 2016 (20 de novembro), um tempo de viver cada dia a misericórdia, tanto ao nível pessoal como enquanto Igreja… e até na sociedade em geral.

Num destes dias perante uma assembleia eucarística bastante grande – fora do habitual, pois ocorriam as promessas dos escuteiros – simplesmente ousei dizer esta frase: ‘olhemos uns para os outros e vejamos se temos rostos de misericórdia’… Claro que não houve tempo para ver o efeito da frase, pois urgia continuar a celebração e, possivelmente, muitos dos praticantes ocasionais nem se terão apercebido do que quereria dizer tal ‘provocação’, mas temos mesmo de ver se os nossos rostos refletem a misericórdia de Deus e/ou se temos consciência da misericórdia derramada em nossas vidas!

= «Precisamos sempre de contemplar o mistério da misericórdia. É fonte de alegria, serenidade e paz. É condição da nossa salvação. Misericórdia: é a palavra que revela o mistério da Santíssima Trindade. Misericórdia: é o ato último e supremo pelo qual Deus vem ao nosso encontro. Misericórdia: é a lei fundamental que mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que encontra no caminho da vida. Misericórdia: é o caminho que une Deus e o homem, porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar da limitação do nosso pecado» (n.º 2).

Este número da bula ‘Misericordiae vultus’ funciona como o sumário de todo o texto de vinte e cinco números onde se faz um percurso bíblico desta identidade de Deus e o próprio Papa explica a razão de ser do seu lema episcopal – ‘miserando atque eligendo’… numa alusão ao chamamento misericordioso de Jesus para com Mateus…

Através desta bula papal podemos perscrutar o coração do Papa Francisco e das suas propostas pastorais e desafios sociais… até às (ditas) periferias a que ele nos impulsiona como ‘Igreja em saída’.

= «A arquitrave que suporta a vida da Igreja é a misericórdia… A credibilidade da Igreja passa pela estrada do amor misericordioso e compassivo… É triste ver como a experiência do perdão na nossa cultura vai rareando cada vez mais… O perdão é uma força que ressuscita para nova vida e infunde coragem para olhar o futuro com esperança» (n. 10).

Eis novo número essencial para entendermos o texto e a pessoa do Papa Francisco. Com efeito, somos chamados, como Igreja e em cada um dos cristãos (paróquias, comunidades, associações e movimentos) a sermos ‘oásis de misericórdia’, vivendo, por excelência, a bem-aventurança – ‘bem-aventurados os misericordiosos porque alcançarão misericórdia’ e seguindo o lema do ano jubilar: misericordiosos como o Pai!

Embora fazendo já propostas para a quaresma do próximo ano – como as ’24 horas para o Senhor’, o envio dos ‘missionários da misericórdia’ e uma maior consciência dos confessores como verdadeiros sinais da misericórdia do Pai – o Papa coloca o dedo nalgumas feridas onde deve ser derramada urgentemente a misericórdia, como na corrupção e no apego ao dinheiro… Vivendo ainda a correta relação entre justiça e misericórdia, tal como Jesus a viveu e a ensinou, poderemos sentir a gozosa presença do amor misericordioso de Jesus, feito perdão e indulgência em nós e para connosco.

= Ao lermos a bula papal sentimos que temos de nos deixar tocar pela misericórdia divina, fazendo a experiência do perdão recebido e dado para podermos testemunhar por gestos e sinais essa mesma misericórdia divina. Nós, cristãos, seja qual for a sua vocação ou ministério, idade ou cultura, lugar ou espaço, temos de ser vitrinas da misericórdia divina, onde Deus se faz perdão e paz, apercebendo-se os outros disso muito mais pelo que somos do que por aquilo que dizemos…

Queremos ser verdadeiros rostos de misericórdia, já?  

 

António Sílvio Couto

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