Há experiências que só quem passa por elas, as pode
entender e/ou compreender, quem vive idênticas situações. De pouco adianta
termos lindas ideias, se elas esbarrarem na vida simples e provocatória do
nosso dia-a-dia… Há momentos que marcam a vida e outros que a condicionam,
mesmo sem disso nos apercebermos.
Ora, por esta época foi comum ouvir pessoas a desejarem
‘boa páscoa’, mas o conteúdo dessa expressão se notava que estava vazio de
significado, pois desejar aos outros aquilo que se não pratica, poderá ser, no
mínimo, incoerência ou falta de sentido… até do ridículo. Com efeito, a Páscoa
precisa de ser vivida no sentido judaico-cristão, sendo envolvido pelo
significado religioso mais profundo e altíssimo: o da passagem de Deus e a
vitória de Jesus sobre a morte. Reduzir a ‘páscoa’ às iguarias gastronómicas
como que será – como em tantos outros momentos simbólicos da nossa dimensão
coletiva – usufruir das consequências sem lhes apreciar as causas…
1) Casa vazia… a de
viver e a de celebrar
De fato, a casa onde vivemos (moramos, que é muito mais
do que residência ou endereço de contato), revela aquilo que nós somos… mesmo
sem disso nos darmos conta, a sério. Que dizer, então, da nossa casa onde não
temos ninguém que nos espera nem com quem partilhamos as coisas e loisas da
vida real e, por vezes, agreste? Há quem cultive a presença dalgum animal de
estimação. Há quem se entretenha com algum hóbi circunstancial. Há quem faça de
sua casa uma espécie de retábulo de devoções (religiosas ou clubísticas)
aceitáveis. Duro, duro é não ter com quem desabafar… mesmo que, certos meios de
comunicação (tv, internet, tlm ou outro qualquer), vão disfarçando a falta de
presença humana real e afetiva.
Se isto se vive na casa de residência, parece que agora
os (nossos) lugares de culto se estão a esvaziar e/ou a preencher de múltiplos
vazios paralelos. E nem certos espaços de convívios conseguem disfarçar o
isolamento insensível e uma solidão narcotizante.
A tristeza que invade tantos rostos e vidas não é mais
disfarçável, pois tal sentimento vem do mais profundo da pessoa e vai tomando
as texturas mais visíveis e as revelações inquestionáveis… do ser. É um facto,
as pessoas estão cada vez mais tristes e já não o disfarçam… nem com os
remédios da fé.
Como poderemos, então, modificar esta espécie de
hipocondria social… com sintomas de quase epidemia? Que soluções poderemos
intentar para fazer reverter este estado público e privado… onde todos estejam
em causa e queiram corrigir-se? Quem poderá ajudar-nos a ultrapassar tais
situações?
2) Aprender a saber
escutar
Sem qualquer pretensão de lições – estas poderão ser
ainda mais um adiamento para o real problema – ousamos deixar aqui – colhendo
em primeiro aspeto este plano de caminhada – algumas pistas para que nem a casa
vazia seja uma espécie de sepulcro vivo nem a alma se esvazie de sentido na
existência:
- Olhos nos olhos
– urge sabermos ver o olhar dos outros e o que ele nos revela. Por isso, temos
de desencobrir a beleza dos olhos desses filtros com que nos envolvemos e com
que, tantas vezes, lemos os outros… Mudar de óculos, já!
- Diálogo sincero
– urge termos quem escutemos e quem nos escute. Por isso, temos de tirar os
fones dos ouvidos e aferir-nos uns aos outros sem preconceitos nem julgamentos.
Quando o ouvido começa a falhar não podemos tirar conclusões precipitadas… se
ouvimos menos bem ou até mal!
- Capacidade de
perdão – urge que cada um assuma os seus erros e não queira servir-se dos
erros dos outros para os acusar. Por isso, não adianta queremos que os outros
mudem se nós não fizermos o esforço por modificar-nos a nós mesmos. Basta de
lições, precisamos de compreensão mútua e sincera.
Parece que este tempo pascal poderia e deveria ser um bom
momento de caminhada para estarmos atentos aos outros, pois, há muita tristeza
disfarçada devido ao desinteresse negativo de uns pelos outros…
António Sílvio Couto
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