Mais uma vez somos induzidos em erro pelas forças mais estatizantes do nosso espetro político: a empresa de comunicação Rádio e Televisão de Portugal (RTP) usufrui de uma dupla beneficiação: recebe dinheiro dos contribuintes e ainda (em quase concorrência desleal) pode ter publicidade paga pelos anunciantes e, por consequência, pelos clientes-telespetadores... Segundo dados consultáveis a RTP tem quase mil e seiscentos empregados...em diferentes plataformas e canais (oito), não esquecendo os centros de produção (dois), as delegações nacionais (doze), os correspondentes internacionais (treze)... num mundo nem sempre claro ou totalmente aberto.
1. Vejamos situações e contributos que todos (de forma indistinta e anónima) damos para esta empresa, que gera e gere tantos interesses, de forma direta e indireta. Se atendermos à fatura da eletricidade veremos que a ‘contribuição para o audiovisual’ é significativa, preenchendo no contexto geral das receitas da RTP mais de 190 milhões de euros (números do ano passado). Mesmo que não tenha qualquer aparelho de receção de televisão todos contribuem de forma universal e quase coerciva...
2. A publicidade na (dita) televisão pública significa mais de 20 milhões de euros anuais, o que representa dez por cento das suas receitas. Nas regras gerais da publicidade televisiva, a lei determina que só haja publicidade até doze minutos por hora, isto é, vinte por cento em programas de acesso livre. No caso do estatuto da RTP o contrato de concessão só permite seis minutos de publicidade por hora. Está previsto que, durante os noticiários, programas de informação política ou filmes, a publicidade só pode interromper a programação a cada trinta minutos de duração.
3. Não deixou de ser uma questão ideológica a medida que o governo em funções viu derrotada na votação do Orçamento para 2025 de pretender retirar a publicidade até 2027 na RTP. Qual foi a razão de fundo desta união em defesa da publicidade na televisão (ainda) estatal? Não andará ainda a flutuar a ideia de que convém ter uma ‘voz do dono’ quando se está no poder? Quem tem medo da concorrência: a acomodação ou a competência? A desconfiança para com a comunicação social privada revela que algo está escondido no serviço da televisão estatal? A ver pela unicidade em defesa da RTP e afins não parecerá que ainda paira na mente de muitas pessoas o saudosismo da voz única e sem discordância?
4. Fique claro: defendo que a comunicação social (seja qual for a forma de se apresentar) deve ser livre de tutelas e de influências, podendo e devendo cada um escolher quem quer ver e ouvir, sem teias nem peias. Ora isto que vimos de tutelar a comunicação social sob proteção do Estado não passa de uma visão protecionista e condicionadora da escolha, tanto de quem faz como de quem consome. De uma forma um tanto infantil se pretende que todos (ou a maioria) seja doutrinado pela forma de dizer ou de perspetivar quem se deixa guiar pela televisão estatal. Talvez desta forma não se evolua na qualidade nem se ganhe na diversidade/pluralidade de leituras das coisas e das pessoas.
5. De facto, mais de três décadas decorridas parece existir um nítido servilismo ao que vem do estatal. Quem acompanhou o emergir das rádios locais (início dos anos 80) e, posteriormente, o surgir das televisões privadas como que sente um certo arrepio quanto a esta uniformidade dependurada no vetor da comunicação social do Estado. Acumular as duas fontes de rendimento – contributo do audiovisual e da publicidade – além de desonesta é dar mais meios do que os outros têm: para além de injustiça é falta de imparcialidade.
6. Até quando teremos de suportar a subsidiodependência de tantos a sobreviverem nas ondas do poder e da ideologia reinante, mesmo que já tenham terminado a validade?
António Sílvio Couto
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