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sábado, 23 de novembro de 2024

Campanhas enganosas… à custa da ignorância

 


Nesta época prévia ao Natal vemos surgirem diversas campanhas (ditas/apelidadas/pretensamente) de solidariedade, seja com gestos ‘fraternos-e-solidários’, seja com artimanhas de empresas de consumo, seja mesmo através do recurso à recolha de bens e de serviços, usando mesmo o contexto eclesial. Há casos que são apresentados como de benemerência à custa de falsa participação dos compradores, noutros casos como que se usa a menos boa condição dos ‘pobres’ para fazer deles matéria de simulação.

1. Quem não foi já às compras – numa certa cadeia comercial, que não identifico por respeito aos usados – e, na hora de pagar, lhe é perguntado se quer participar na campanha de ajuda a uma determinada instituição, doando um montante relativamente pequeno? Se estou imbuído no espírito de querer participar lá deixo adicionar à conta mais uma pequena ajuda. Só que esta aparece como sendo da cadeia comercial-consumista e não do cliente participante, mas, quando forem apresentadas as contas, surge que foi dele e não minha, embora o tenha feito de forma enganosa, servindo-se da minha boa vontade manipulada. Os milhares angariados (e são muitos em todo o país) – e posteriormente distribuídos com pompa e circunstância – não são de facto dos compradores mas da entidade benemerente. Pior, a grande cadeia comercial entra no role dos mecenas, sem nada ter feito, antes só usando os clientes, que nem compraram nem doaram nenhum produto, só deram aceção a ser acrescentada uma pequena migalha ao bolo do capital recetador.

2. Para os mais céticos estas campanhas natalícias soam a aproveitamento dos mais desfavorecidos – prefiro esta palavra à expressão ‘mais necessitados’ – como se eles só precisassem de comer e de bens essenciais por ocasião do Natal. Outros replicam: mas se já nem no Natal os lembrássemos seria ainda pior. De facto, ainda vamos vivendo esta sensibilidade aos outros, partindo da realidade humana-divino emergente do mistério da Encarnação de Jesus e do seu nascimento, que celebrámos no Natal. Com efeito, a nossa comunhão de uns com os outros ganha nova forma e força desde a presença e participação de Jesus com os humanos. De resto, a mera filantropia horizontalista, que move tantos dos nossos contemporâneos, poderia ser melhor informada se soubéssemos e fossemos capazes de a transcender no mistério do Natal de Jesus.

3. É quase repugnante – digo-o do ponto de vista cristão – que se fale do Natal revestindo-o de certas roupagens, que têm tanto de populista, quanto de abjeto e de melindroso: reduzir o Natal a mesa farta e a consumo materialista, soa a algo que deixará amargo de boca na hora da avaliação. Alimentar o espírito de Natal com o mero flamejar de luzes, que já nem são velas nem aquecem, antes só fascinam quem as vê. Celebrar o Natal esquecendo O festejado, torna-se algo de ilusão e sem nexo de causalidade. De que interessa fazer ‘jantares de natal’, se, ao longo do ano, as pessoas se ignoram ou mesmo detestam? Que interessa reunir para comer, se não se consegue confraternizar no resto ano? Não andaremos, mais uma vez, a ficcionar aquilo que deveria nortear a nossa vida social, familiar e pessoal?

4. Recristianizar o Natal é urgente, se ainda conseguirmos perceber o que está em causa, pois, seria de duvidosa consciência querer usufruir daquilo que nos favorece e menosprezar as causas da mesma celebração. Deveríamos refletir sobre as razões que levaram tantas pessoas a quedar-se pelo ‘natal consumista’, mesmo que já tenham tido a vivência do natal cristão. Como poderemos, enquanto cristãos/católicos, traduzir em gestos, palavras e sinais o Natal de Jesus nos nossos ambientes? Já paramos um pouco para tentar encontrar a quem vamos anunciar o Natal de Jesus com simplicidade e verdade?

5. Não esqueçamos a mensagem central do Natal: hoje vos anúncio que nasceu para vós o Salvador, Jesus Cristo Senhor! Usemos as ferramentas já provadas – coroa do Advento, presépio ou até presentes (que não as prendas)– para que Jesus possa estar mais vivo e não meramente decorativo. Será que Jesus tem lugar no meu coração, na minha casa e na minha família?



António Sílvio Couto

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