Depois de vinte e oito anos ao serviço da diocese de Setúbal – de 1997 a 2024 – regressei à celebração da Quinta-feira santa com
os membros do meu presbitério. Passei nas terras sadinas dois terços dos quarenta e dois anos de padre e agora é tempo de tentar acertar com o ritmo da nossa arquidiocese.
Sem querer dar quaisquer lições, deixo uma breve partilha de quem esteve
fora e viu outras realidades, chegado agora tento aferir-me às condições e
condicionantes da realidade e dos seus adereços.
Embora nunca tenha deixado de pertencer ao clero bracarense, vivi com toda a
intensidade possível e quase inimaginável as preocupações, necessidades e
projetos de Setúbal. Tive quatro bispos no tempo que tive ao serviço de Setúbal
– D. Manuel Martins, uns parcos seis meses: D. Gilberto Reis, cerca de dezassete
anos; D. José Ornelas, uns sete anos… com um interregno de um ano e meio, tendo
ainda estado sob a conduta de D. Américo não chegou a um ano.
Nesses tempos lá vividos servi em diversas instâncias – para além de
pároco: treze anos em Sesimbra, Santiago e catorze na Moita, sede de concelho –
e dada a escassez de clero, como vigário (corresponde aqui ao arcipreste),
membro do conselho presbiteral e até do colégio de consultores.
Convivi com muitos dos padres mais velhos, que transitaram do tempo do
patriarcado para a nova diocese, muitos deles de sabedoria e experiência
pastoral, aliadas à indelével qualidade humana e espiritual. Recordo alguns
desses padres: Agostinho, Ricardo, Jaime, Manuel Vieira, Manuel Marques, Júlio
Nogueira, David, Sobral, Francisco Graça, Alfredo Brito, Manuel Frango e, mais
recentemente, de modo surpreendente, Carlos Russo, falecido há menos de um ano
com cerca de sessenta anos …
Nesses quase trinta anos vi serem ordenados – participei na quase totalidade
dos momentos celebrativos – mais de trinta novos padres, alguns dos quais
exercem tarefas relevantes dentro e fora da diocese. Momentos como a ‘escola da
fé’ ou a celebração dos primeiros vinte e cinco anos de diocese, no ano 2000,
ou até a colaboração em atos religiosos de índole popular… colaborei e ainda
relevei, nas paróquias onde tive responsabilidade, como as conferências quaresmais
e o revigoramento de outras tradições.
Para quem foi nomeado por um ano para prestar ‘serviço extra-diocesano’, os
que vieram depois foram de aceitável fruto e boa captação…mesmo nas publicações
editoriais, com mais de quarenta títulos e a participação em vários órgãos de
comunicação social.
Regressado ao espaço territorial e eclesial da arquidiocese de Braga,
deu-se a coincidência de ser nomeado pároco da ‘unidade pastoral de Esposende
poente’, que engloba as paróquias de Mar e Marinhas.
O tempo de diáspora foi bom para aprender outras coisas e ser confrontado
com realidades diversas. Agora há toda uma necessidade de entender aquilo que
ainda norteia o ‘nosso’ povo cristão, à mistura com atitudes de quase rejeição
(tácita ou explícita) de alguns ‘valores’ tradicionais ou a roçar o
tradicionalista. Não podemos confundir a árvore com a floresta, mas nesta
nota-se mais as ervas daninhas do que as árvores que dão bom fruto…
Atendendo à velocidade a que muitas coisas acontecem torna-se sensível que
saibamos discernir o essencial do secundário, aprendendo a compreender ‘os sinais
dos tempos’ (GS 4) com humildade e abertura de mentalidade.
Chegado a esta idade sinto que ainda acredito numa Igreja onde os dons-carismas-ministérios
podem ajudar a viver com sensibilidade ao Espírito de Deus, na sua diversidade e
comunhão.
Isso de ‘Igreja sinodal’ é mais do que uma configuração circular, por oposição
à visão piramidal, mas antes exige humildade e verdade cada um para consigo mesmo
e de todos para com os outros…
Nunca fiz propostas para que outros executem. Quando proponho, quero e
aceito fazer parte da solução e não para adiar o problema!
António
Sílvio Couto
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