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quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Festejar na data efemérides e eventos

Por estes dias surgiu uma hipótese algo bizarra – na minha interpretação – que, prevendo-se a hipótese de chuva um tanto intensa no dia aprazado, deveria ser adiado o desfile de carnaval das crianças, podendo ser feito na semana seguinte, já em época de quaresma... Deste modo se agradaria, se o tempo atmosférico o permitisse, aos intentos de festejos fora do dia e aliando os dias de ‘férias’ escolares com a dedicação das escolas.

1. Este breve episódio trouxe-me à lembrança uma outra aferição de datas – neste caso no setor religioso – em que o dia litúrgico por ter caído numa sexta-feira foi transferido para o domingo seguinte. Nesta situação veio-me à conjetura a hipótese: se o Natal calhar à 6.ª feira só será celebrado no domingo seguinte ou se a passagem de ano for dois (ou três) dias antes do domingo será mudada para este dia do calendário?

2. Desgraçadamente vivemos cada vez mais ao sabor e no ritmo da sociedade de consumo, cunhando e divulgando datas e expressões que não passam de servilismo ao valor consumista que nos invade e torna seguidores quase acríticos. Veja-se o que dizemos quase sem pensar: ‘bom-fim-de-semana’, onde se inclui o domingo como se fosse um dia de fim, quando, afinal, é o primeiro ‘dia da semana’, ou como explicaremos que o dia seguinte ao domingo se diga: ‘segunda-feira’? É verdade que esta designação só se encontra na língua portuguesa, pois no resto das línguas os dias da semana continuam a dar tributo aos deuses pagãos ou aos seres mitológicos: lua (lunes, lundi, monday), marte (martes, mardi, tuesday), mercúrio (miércoles, mercredi, wednesday), júpiter (jueves, jeudi, thursday), vénus (viernes, vendredi, friday) ... com a exceção do sábado (saturday) e nalgus casos indo fundar-se no judaísmo e o domingo com incidência nitidamente cristã, mesmo com as exceções de sunday (dia do sol)...
A designação de ‘féria’ do português dada aos dias da semana é do tempo de S. Martinho de Dume, um arcebispo de Braga do século VI, que cristianizou os dias da semana e colocou o domingo como o ‘primeiro dia’ e não como o último à boa maneira da cultura anglo-saxónica reinante...nas questões económicas e laborais.

3. Colocando as questões neste enquadramento podemos e devemos ser mais exigentes na linguagem e, sobretudo, não será avisado culturalmente continuarmos a falar e a comportarmo-nos como seres que vivem sem colocar questões ou andaremos manipulados por quem nos faz ser aquilo que não queremos ou que nos leva a viver na rotina da vulgaridade.
Reparemos no leque de ‘feriados religiosos’ que ainda usufruimos em Portugal – Ano Novo (1 de janeiro), 6.ª feira santa (anterior ao domingo de Páscoa), Corpo de Deus (60 dias depois da Páscoa), Assunção (15 de agosto), Todos os Santos (1 de novembro), Imaculada Conceição (8 de dezembro) e Natal (25 de dezembro) – muitos deles não passam de camuflagem para que sejam usados por quem não os usa para a finalidade com que foram propostos, antes servem para uma manipulação das questões religiosas por quem delas se renegue ou afaste. Mesmo que de forma exagerada sugiro que sejam supridos os ‘feriados religiosos’, sobretudo para que não permitam usar da festa quem dela não participa minimamente. Trabalhe quem não honra os que lhe dão a faculdade de feriar...

4. Numa visão algo essencial: nunca por nunca se deverá fazer arranjos (mais ou menos interesseiros e ao sabor materialista) de datas para que efemérides e eventos sejam deslocados da data correta, pois o ‘dia preciso’ faz com que tenha mais significado e possa ser a razão de ser daquilo que queremos festejar e celebrar... Se não foi (ou é) possível fazê-lo no tempo adequado fica para outra vez mais apropriada...



António Sílvio Couto

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