Numa
análise simples, correta e contundente um jornalista – desses que ainda sabe o
que é o lead da notícia, que diz aquilo que pensa e avalia as análises, sem
querer agradar ao patrão ou ao canal onde intervém – referia, ainda antes das
eleições, que, depois destas, poderemos perceber: que acabou a ‘paz social’ em que
vivemos nos últimos seis anos…talvez à força e sem grande suporte verossímil.
Quais
eram (são) os indícios de que a ‘paz social’ – com a ausência de protestos, uma
forte diminuição de greves, um aligeirar de conflitualidade nas ruas e nos
trabalhos, um certa ‘harmonia’ entre os vários quadros intervenientes sociais,
sindicais ou económicos – estaria ameaçada e que os itens apontados poderão
emergir contra essa paz? Será que a ausência de conflitos abertos significava
que havia paz? Não teremos vivido antes numa paz podre, com focos latentes de
irascibilidade, de azedume ou de sobreposição entre ‘classes’, setores e
animosidades?
Fazendo
a leitura dos números da votação – maioria – poderemos encontrar algumas das
respostas para o fim da tal ‘paz social’, feita de equilíbrio de tendências, de
conquista de direitos ou mesmo à luz do pagamento de favores aos beligerantes,
nas diversas instâncias de poder, de participação ou de manipulação.
1. Muitos se arrepiam com os votos
conquistados pelo ‘Chega’…Uns tais democratas da verborreia quase contestam
quem nele votou, como se houvesse votos bons e votos indecorosos…aqueles são
dos meus apaniguados, estes são dos que não pensam como eu; aqueles são de uma
certa esquerda – trauliteira, aguerrida e ilustrada – numa certa visão, estes
são dos ignorantes que se exprimem de forma diferente e com as mesmas
obrigações e regalias…Deste modo a ‘paz social’ que vai acabar será salutar que
deixe de estar encoberta e submissa aos interesses de um ‘tal povo’, com
reduzida expressão… e com uns tais ‘trabalhadores’ que não passam de mitos ao
serviço da dialética marxista ainda em vigor!
Nada me
simpatizo com o ‘Chega’, dizendo, desde já, que votei sempre da mesma forma em
quarenta anos!
2. Como se pode dar tudo a todos,
se o bolo minguou e são mais os pretendentes do que o que há para distribuir?
De facto, só quando se produz, se poderá manifestar alguma abundância. Com
efeito as empresas poderão pagar ordenados, se não têm meios nem condições? O
fim da ‘paz social’ conquistará as ruas, se quiserem esticar os vencimentos sem
meios que sustentem a sua exequibilidade. Numa mínima compreensão dos factos,
teremos de considerar que só podemos distribuir riqueza se ela for produzida,
amealhada e conquistada. Tudo o resto soará a demagogia, a propaganda – esta
não acontece só por ocasião das eleições, é muito mais tentacular – e,
sobretudo, a manipulação de quem dirige ou governa. Por isso, a ‘paz social’ é
algo mais profundo do que ter dinheiro na mão para consumo: é preciso saber de
onde este veio e se continuará a ser servido com verdade e justiça.
3. Eis os resultados: PS – 41,6 %
(117 deputados); PSD – 27,8 % (71 deputados); Chega – 7,1 % (12 deputados); IL
– 4,9 % (8 deputados); BE – 4,4 % (5 deputados); CDU – 4,3 % (6 deputados); Livre
– 1,5 % (1 deputado); PAN – 1,2 % (1 deputado)… Abstenção: 42,04 %. Que governo
com esta maioria? Que estabilidade? Andamos a perder tempo e feitio! Brincar, não
compensa!
4. Houve assuntos esquecidos e/ou
evitados, antes das eleições, que terão de ser tomados a sério. Em tempo já de
seca, não se falou de água e esta –
como sempre – é tema que envolve consciencialização tanto no uso como na
racionalidade pessoal e coletiva. Não basta considerar que isso é questão
rural, pois os (ditos) citadinos precisarão dela diariamente. Se não chover em
breve, algo poderá caminhar para o dramático…
Quem
falou da eutanásia? Mais uma vez os
partidos se acobardaram sobre a temática e quererão fazer aprovar aquilo que
nem sabemos o que pensam ou como resolverão o assunto de forma séria e
civilizada. Matar não resolve nada, nunca!
A regionalização foi abordada? Só se foi
em questiúnculas baratas. Mais cedo do que tarde pretenderão impô-la, mas como
recurso de emprego a ‘políticos’ de categoria secundária. Haja seriedade e bom
senso!
António Sílvio Couto
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