Por estes dias o termo ‘negativo’ pode ter sido das
palavras mais ansiadas em ver escrito ou de ter ouvido… No entanto, não é desse
‘negativo’ sanitário a que nos queremos referir.
Ora, numa outra lógica da linguagem, por vezes,
surge a proposta de negar duas vezes, na mesma frase, parecendo isso ser algo
positivo. Isto inserir-se-ia naquela asserção (mais ou menos matemática) de que
menos com menos dá mais.
1. Nos tempos mais recentes temos andado entretidos
com fraseologias algo vazias, senão mesmo ocas de significado. Veja-se o que se
diz – na empestada lógica do politicamente correto – de que não há obrigação de
vacinação das populações, mas para ter acesso a uma razoável quantidade de
locais e serviços de possibilidade pública têm de ser apresentados documentos
que obrigam à vacinação e, sem tal ‘livre-trânsito’ imprescindível, fica-se à
porta. Portanto é negada liberdade de não ter sido nem de não querer ser
inoculado…Mas ninguém assume a obrigação. Embora gratuito, assuma-se que não é
facultativo, mas antes benéfico para todos. Fique claro: estou vacinado – a
dose de reforço teve de ser adiada – e submeter-me a teste (embora a custo) não
obsto.
2. Mais uma vez emergiu – com o desenrolar da
campanha para as eleições do final do mês – o fantasma que de que quem não
alinha nas ideias que não sejam de uma certa esquerda não tem direito a ter
opinião nem sequer pode exprimir-se com liberdade, pois esta tem de ter um
rótulo da subserviência a certos valores prefabricados, embora já fora de
validade em muitas latitudes.
Nota-se que há uma grela ideológica onde se tem de
entrar e não alinhar acriticamente não permite ser aceite. Alguns denotam
tiques de nomenclatura orwelliana dos finais do século passado, não permitindo
que certos animais se destaquem dos seus congéneres. Com que subtilezas
ressurgem ciclicamente estas coisas em maré de eleições, sobretudo se estão em
jogo campos ideológicos mais ou menos antagónicos, desde que não se misturem
nas conveniências práticas.
3. Temas não essenciais vão ocupando espaços de longa
discussão, deixando de fora o que mais interessa debater, esclarecer ou mesmo
questionar. Tem algum jeito trazer à liça questiúnculas resolvidas há quase
dois séculos, como a pena de morte ou a prisão perpétua? Os problemas atuais
não cativam mais a atenção de quem precisa de ser educado nas convicções
cívicas? Habilidosos de tal entretenimento gastam parcos minutos em
frentes-a-frentes de gritaria e malcriadez. Qual jogatana de boxe ou combate de
kickboxing somam os pontos após cada disputa…sem atender ao mínimo interesse
dos assuntos, mas não deixando que não consigam dizer nada… Até já dão
pontuações…ridículas, tendenciosas e sem nexo. Será que isso se reverte em
votos ou vale antes desinteresse?
4. Os leques de comentadeiros/as – dizem que têm
carteira de jornalista – parecem não passar de arietes camuflados de forças em
competição. Agora que o povo está novamente em confinamento encapotado, tais
programas podem concorrem ainda mais acentuadamente para a abstenção, pois
quase tudo é parece recesso, vazio e requentado de outras épocas e estações.
Há uma questão que considero abominável: uns tantos
acham que os votos neles devem valer, mas se forem expressos noutros não têm
idêntica valorização. Felizmente cada um só tem um voto ou será que não é bem
deste modo?
5. Não parece minimamente sério nem credível a
discussão sobre a influência na votação das pessoas que possam estar confinadas
por ocasião das eleições. Certas sugestões continuam a estar eivadas de
marginalização de quem tem de se submetido a restrições em razão do vírus.
Alguns precisariam de não se colocarem acima dessa possibilidade, pois, com tão
rápido contágio, hoje posso ser obrigado a não poder sair de casa, quando ontem
não o previa… Negar a negação pode não servir para tudo nem para todos!
António
Sílvio Couto
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