Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



terça-feira, 3 de outubro de 2017

Indefecáveis do sistema



Nos tempos pós-eleitorais surgem – sobretudo nas hostes vencidas – uns tantos salvadores das derrotas indesejadas: há os que surgem por conveniência dos dados; outros aparecem nessa atitude de abutre à portuguesa de regozijar-se com as derrotas alheias; alguns são atirados para fazerem (se soubessem!) melhor; mais uns tantos emergem das longas penumbras obscuras de pretensões não-aceites; numa razoável lista de candidatos poderemos ver muita parra e pouca uva…agora que estamos no lavar-dos-cestos das vindimas, isto é, de colher os frutos sem termos tratados das etapas necessárias anteriores…

Bem sei que o termo ‘indefecável’ não é reconhecido pelo dicionário. Mas, se fizermos a decomposição da palavra encontramos como termo central – ‘defecar’ – que qualquer mortal conhecerá duma certa terminologia um tanto erudita referente a uma necessidade fisiológica mínima e essencial…ao equilíbrio somático-psicológico. O prefixo ‘in’ como que nos leva a considerar uma espécie de movimento e de inclusão de quem participa na ação apresentada… Por seu turno, o sufixo ‘ável’ leva-nos a considerar algo/alguém que participa na ação suscitada e com a possibilidade de praticar ou de sofrer a dita ação… (perdoando a redundância) ativamente.

Numa palavra: ‘indefecável’ será alguém que faz parte da ação de expelir os resíduos do organismo, fazendo-o de forma regular e em consonância com os atributos do sistema onde se encontra inserido… talvez ele mesmo num enquadramento de matéria inorgânica dispensável. 

= Pela leitura que fazemos dos acontecimentos mais recentes da nossa vida social e política, fomos vendo muitos exemplares de indefecáveis, gerados, geridos e geradores do sistema partidário em cujo quadro nos inserimos, vemos e vivemos. Uns já saíram de circulação; outros esbracejam para flutuarem antes do afundamento previsível; uns quantos tentam posicionarem-se para sobreviver um pouco mais; diversos aspiram a entrar no sistema, que, mesmo podendo ser pouco recomendável, ainda será salvo-conduto para mais uns tempos de emprego às custas do dinheiro estatal…  

= Quem tenha um mínimo de memória saberá que dos derrotados não reza a história, exceto se estes se souberem reinterpretar nas horas menos afortunadas. Será, no entanto, nos momentos de vitória que se conhece o estofo de quem ganha, pois os eflúvios vitoriosos podem ofuscar a racionalidade, levando a cometer erros que mais tarde serão pagos com juros bastante altos.

Nalgumas situações vemos que as pessoas se tornam irrazoáveis sobre o modo como conseguiram conquistar os seus feitos…vencedores. Há casos onde o amesquinhamento alheio é, desde logo, uma espécie de certidão de óbito para novas batalhas. Se há coisa que a história nos ensina é, como diz o povo, ‘não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe’! Pena é que que os atores se esqueçam do enredo do passado…

Disto e de muito mais – sobretudo no apadrinhamento de ‘falsas notícias’ – temos visto a serem entretecidos muitos dos episódios criados, explorados e noticiados por uma certa comunicação social, onde uns quantos ‘jornalistas/comentadores’ se vão tornando os maiores paladinos dos indefecáveis em vigor ou a serem promovidos a curto e a médio prazo. Alguns são os mesmos de serviço há décadas. Outros como que se tornam ventríloquos dum espetáculo de circo em maré de digressão. Outros ainda teremos de duvidar sobre quem lhes paga para fazerem o papel ora de entrevistador/a, ora de comentador/a… dependendo da hora e do programa…senão mesmo do local. Haja vergonha! 

= Quando tantos se vangloriam dos seus feitos e efeitos, torna-se urgente e essencial não nos esquecermos que tanto estamos (ou podemos estar) na vanguarda, como bem depressa poderemos encontrar-nos na retaguarda… Somos, enquanto humanos, muito mais vulneráveis do que julgamos. Assim o desempenho dos outros – sucessos e derrotas – nos possam servir de aprendizagem em cada circunstância da nossa ténue vida. Que não nos deixemos ludibriar com os elogios nem atemorizar com as críticas… tudo faz parte da vida. Assim o entendemos correta, inteligente e humildemente.        

 

António Sílvio Couto



Sem comentários:

Enviar um comentário