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segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Questões de linguagem… a aprender, sempre!


Um destes dias estava num grupo informal – onde se contavam alguns padres e outros tantos que beberam da fonte de formação do seminário – e surgiu uma certa avaliação a um programa pastoral de uma determinada diocese… que pretende refletir sobre a família a curto e a médio prazo… Evitarei identificar tal diocese, mas servir-me-ei da inquietação para colocar questões à linguagem com que falamos de alguns assuntos… sem atendermos à diversidade de perspetivas… mais laicas sem serem meramente laicistas.

Falava-se sobre o tema dos filhos e um certo prelado pretendia incluir na temática a formulação: ‘os filhos, dom de Deus’… ao que alguém ripostou, dizendo que conhecia até famílias cristãs que aspiravam a ter filhos e eles não aconteciam, bem como outros que, passada a idade da fecundidade, queriam ter filhos e tinham de recorrer ao sistema da adoção… Com seriam, nestes como noutros casos, os filhos, dom de Deus? Como poderiam tais cristãos/católicos interpretar essa expressão da doutrina da Igreja, quando o sofrimento para terem filhos era mais do que um dom, mas, possivelmente, uma luta e uma grande conquista?

Naquela conversa de pessoas em sintonia na mesma fé, como que intui que há tantas coisas que nós – bispos e padres, leigos e frequentadores habituais da igreja/missa – usamos que estão (ou podem estar) um tanto desconexas com a linguagem do mundo, senão no conteúdo, pelo menos na forma… de ser em Evangelho.

Já percebemos que há um certo bispês e um outro padrês, que não tem compreensão no léxico do comum dos fiéis…leigos. Por vezes precisamos de um dicionário para descodificar o que se pretende dizer… mesmo que sejam usadas as mesmas palavras.

Desgraçadamente até são muitos dos frequentadores do rito que fazem perigar o ritual, pois, formalmente, vivem as fórmulas, mas não entende o espírito da formulação. Já encontrei tanta gente praticante que não conhece o espírito da celebração, pois como que se ficam na exterioridade e não captam o central do celebrado...uma Pessoa, Jesus!

Como dizia um padre (conhecido e um tanto brincalhão, sem ser superficial) a uma senhora muito devota, que se reportava muito religiosa: ‘afaste-se para que não me pegue a doença’!... De fato, há fenómenos de religiosidade que mais não parecem do que rituais de cristandade, quando esta já faliu há mais de meio século! É verdade – como dizia, nos anos cinquenta do século XX, um pensador francês, Jacques Maritain – vivemos numa cristandade profana, onde, mesmo que usando termos de índole e de incidência cristãs, não são mais compreendidos numa correta linguagem do Evangelho, servindo antes para confundir mentes e comportamentos de fachada… senão contínua ao menos ocasional.

= Diálogo sincero e honesto… entre todos e com cada qual!

Todos temos tanto a aprender – pois já caducou a era dum certo dogmatismo, tanto teológico como social e eclesial – nas pequenas como nas grandes coisas, dado que cada qual, embora possa estar habilitado a pronunciar-se sobre aquilo de que sabe, deve aprender – em espírito de humildade e de abertura – com os outros que estudam outras matérias e que nos podem ajudar a caminhar de mãos dadas, de coração bem-intencionado e de espírito de simplicidade.

Só quem se conhece e que confia nos terrenos em que se movimenta, pode dialogar com outros em abertura e em sinceridade, pois, sintomaticamente, o problema da Europa não são as crises económicas e financeiras, mas, dramaticamente, a questão de Deus: Este foi expulso da vida de tantos cidadãos acomodados, adormecidos e narcotizados da velha ‘civilização’ europeia, que aqueles outros assuntos (materiais e psicológicos) são diversão e (quase) entretenimento, do problema principal… a crise espiritual!

Para que possamos ter um diálogo sincero e honesto temos de explicar o significado dos termos que usamos, pois, até podemos usar as mesmas palavras e dar-lhes conteúdos diversos. Precisamos de procurar muito mais aquilo que nos une do que aquilo que, factualmente, nos possa separar. Precisamos de purificar-nos de tantos preconceitos, que, tendo algum significado numa determinada época, agora não servem para construir pontes e criar sinergias de paz, de concórdia e de confiança…

  

António Sílvio Couto

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