Em
conversa pessoal e telefónica com várias pessoas, de diferente estrato cultural
e mesmo de sensibilidade diversa sobre questões da vida – onde a fé também
ocupa espaço – e da relação das pessoas umas com as outras, tirei uma breve
conclusão: parece que anda tudo a desistir, o medo possui o relacionamento e
nota-se uma espécie de resignação negativa que só traz maior tristeza e
angústia.
Ora,
estando nós a celebrar a Ressurreição de Jesus Cristo, pode ser oportuno
delinear alguns pontos de partilha/reflexão em ordem a exorcizarmos esse medo,
que não é de Deus, e tão nefasta resignação, que não é virtude, mas só nos traz
aflição.
= Quando o medo faz fugir de nós
mesmos!
Não
deixa de ser significativo, que havendo tantas lamúrias da falta de dinheiro,
os dados referem que este tempo de (ditas) férias da Páscoa foram o melhor da
ocupação hoteleira dos últimos anos. É um fato que as nossas assembleias
celebrantes nas paróquias se esvaziaram de muitos dos pretensos praticantes… e
não terão ido – presumo eu – às celebrações nos locais de descanso…
Não
sabemos com certeza o que leva as pessoas a trocar um tempo mais intenso de fé
por um tempo de férias. Não sabemos as razões, mas podemos adivinhar as
explicações. Não conhecemos todos os motivos, mas poderemos conjeturar a
não-motivação. Não julgamos ninguém, mas deveremos interrogar-nos a nós mesmos.
Com
efeito, a mobilidade humana é uma das grandes caraterísticas dos nossos dias.
Sabemos ainda que as pessoas procuram – até mesmo na linguagem da fé... e na
sua expressão católica – os lugares e sítios onde são melhor atendidas, onde
encontram respostas para as suas questões, onde podem aliar procura com
resposta… Hoje não nos reduzimos à oferta do pé da porta… seja qual for o
produto, mesmo em questões de religião. Por isso, o afastamento da prática da
fé – dizemo-lo do contexto católico, que é o que parece que conhecemos melhor!
– pode ter muitas explicações, mas também pode e deve questionar os
comunicadores e os celebrantes… porque o público tem – no seu entendimento,
sobretudo, emocional – quase sempre razão!
Uma nota
de possível ‘provocação’ – veja-se a realização do jogo principal de um clube,
na área do futebol, que não teve pejo de colocá-lo na tarde do domingo de Páscoa…quase
tudo parou para se associar ao evento. Será esta assumidamente uma nova forma
de religião e de mística? Nada nos move contra ninguém, mas a inovação do
episódio dever-nos-ia fazer refletir… a todos!
Poderemos,
então, deduzir que o medo como que se exorciza na força da união e esta se
exprime em celebrações rituais nem sempre tão consentâneas com a tradição
pessoal ou grupal.
= Resignação ou reivindicação?
Já vai
longe o tempo em que a resposta: ‘tem que ser, resigne-se’, calava os impropérios
de nem tudo decorrer como era desejável. Desde há umas décadas a esta parte,
sobretudo na nossa cultura portuguesa, ouvimos mais: ‘tenho direito… exijo’,
resumindo, deste modo, a capacidade de não ter de se submeter mesmo às
condicionantes da vida com suas agruras e sacrifícios.
Parece
que até o sacrifício com valor religioso e espiritual caiu em desuso. Com
alguma dificuldade se faz apelo à penitência e aos exercícios de abstinência e
de jejum. Temos estado a viver mais ao sabor do hedonismo do que ao ritmo do
estoicismo. A vivência do cristianismo tem tido dificuldade em aferir-se ao bom
proveito das coisas que dão prazer na vida e nem sempre se tem feito um
enquadramento correto da entrega do que custa como processo de purificação
espiritual e mesmo religiosa.
Quantas
vezes há alegria sem se ter percorrido o caminho do Calvário. Quantas vezes os
aleluias de festa não correspondem às genuflexões diante da Cruz. Quantas vezes
os foguetes de contentamento não tiveram o correspondente bater no peito de
arrependimento.
Que a
Cruz vazia de Cristo signifique um revigoramento da paz sem medo de um maior
acolhimento de Jesus na vida e cuidado aos outros!
António
Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)
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