Foi
com surpresa que, por estes dias, li um comentário sobre a necessidade –
nalguns casos mesmo exigência – do silêncio em concertos de música, seja dita
clássica, seja nos concertos rock, seja ainda nos espetáculos de música
popular.
A
questão é tanto mais acutilante quanto alguns dos músicos, dizem que se sentem
incomodados quer com as fotos, quer com os comentários dos espectadores ou
ainda da (excessiva) interação através das (ditas) redes sociais, pelos posts
colocados ao tempo em direto…
Se
esta reação é inesperada, pois o escutar da música como que provoca nas pessoas
uma certa sintonia, o que dizer da ausência de silêncio em tantos momentos e
lugares de envolvência pública.
Vejamos
breves exemplos… um tanto paradigmáticos:
- Na
Assembleia da República é impressionante a quantidade de comentários aos
discursos ou intervenções dos adversários, que, mesmo sem o microfone ligado,
se ouvem os mais díspares impropérios e, casos houve, de pateado e quase de insurreição.
- Repare-se
na confusão que são os programas televisivos onde se tenta discutir um tema: os
intervenientes não se escutam e, por conseguinte, não se fazem ouvir… tal a
barulheira em concorrência… e se for sobre futebol a coisa azeda, quase só
faltando chegarem a vias de fato.
- Atenda-se
também ao ambiente de almoços/jantares… com música de fundo à mistura, onde a
conversa se faz aos pares e quase nunca os comensais da mesma mesa interagem,
pois a conversa não é diálogo.
Outros
campos poderíamos elencar para percebermos que o silêncio não é uma das
melhores caraterísticas dos nossos dias…Quem não tem nada a dizer, fala, fala
muito e alto… ou é surdo sem se ter apercebido!
= Não haverá medo do silêncio?
Deixamos
uma simples estória, que certamente já muito terão refletido, mas útil no nosso
dia-a-dia.
Um dia um pensador indiano fez a
seguinte pergunta aos seus discípulos:
- Porque gritam as pessoas,
quando estão aborrecidas?
Um disse: gritamos porque
perdemos a calma. Outro retorquiu: porque desejamos que a outra pessoa nos
ouça.
O pensador respondeu:
- Sabem porque se grita com uma pessoa,
quando se está aborrecida? A razão é que, quando duas pessoas estão
aborrecidas, os seus corações afastam-se muito e para poderem cobrir essa
distância precisam de gritar de modo a poderem escutar-se mutuamente. Quanto
mais aborrecidas estiverem mais fortemente têm de gritar para se ouvirem uma à
outra através da grande distância...
Por outro lado, sabem o que
sucede quando duas pessoas estão enamoradas? Não gritam, falam suavemente! E por
quê? Porque seus corações estão mais perto, a distância entre eles é pequena e,
às vezes, os seus corações estão tão próximos que nem falam, só sussurram.
Aliás, quando o amor é muito intenso nem sequer é preciso sussurrar, basta
apenas olhar, pois os seus corações entendem-se... porque estão muito próximos!
= Aprender o silêncio, hoje
De
fato, o silêncio não é ausência de barulho, mas antes espaço livre para escutar
o outro e não para lhe impor o nosso falar… assim poderá haver diálogo. Mas
porque estamos excessivamente cheio de nada, há confusão às mínimas palavras,
podendo gerar-se conflitos de interesses egoístas ou guerras de solidões.
Biblicamente
diz-se de Maria: ‘Quanto a Maria, conservava todas estas coisas, ponderando-as
no seu coração… Sua Mãe guardava todas estas coisas no seu coração’! Ora, quem
mais tinha coisas para dizer e ficava no silêncio! Quem mais tinha boas
notícias para comunicar e ficava em silêncio saboreando tudo em seu coração! Quem
como Maria tinha tanto a falar e estava contemplando em seu coração o seu Deus!
Não
tenhamos medo do silêncio verdadeiro, mas antes temamos o excesso de barulho,
que, por vezes esconde a superficialidade e a falta de consistência do que se
pretende dizer… de vazio, inútil e oco!
António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)
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