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quarta-feira, 30 de maio de 2012

Troca de favores – cultura ou tentação?

Segundo um relatório do sistema nacional de integridade, revelado, recentemente, há uma rede de troca de favores entre os vários membros do governo – seja do atual, seja de outros. Aquilo que alguns rotulam de ‘fator C’ – talvez possa ser de ‘cunha’, ‘compadrio’, ‘corrupção’ ou outra palavra iniciada com esta letra... mesmo que possa ser positiva como ‘confiança’, ‘competência’ ou até ‘carreira de sucesso’...
Um dado digno de registo, tendo em conta aquele relatório, é o que se refere à conivência (ou será antes, conluio?) entre membros do governo e certos gabinetes de advogados, bem como à (pretensa) declaração de rendimentos dos titulares de cargos públicos, com a incumbência de fazerem tal declaração no início e no fim de cada mandato e não anualmente, como era habitual... para que possa haver clareza de meios e de fins.

= ‘Ser esperto ou parecer sério’? – eis a questão que poderia ocupar-nos numa reflexão mais ou menos simplista. De fato, como que vivemos num estado de suspeita sobre quem ocupa (ou pretenda candidatar-se) algum cargo de teor político, sobretudo, se for remunerado, de forma direta ou indireta. De muitos e variados modos se faz cair um certo labéu sobre quem está na vida política, extrapolando de casos pequenos para a generalidade de todos... numa muito desagradável acusação sobre competentes e prevaricadores, de honestos e corruptos, de gente de bem e uns tantos menos bons...

Sem nos darmos conta como que colocamos ao mesmo nível pessoas sérias e desonestas, que certamente as há, pois, certas anormalidades não acontecem por arte do acaso, mas antes têm de ter sujeitos e operacionais, tenham eles rostos ou se escondam sob a capa do anonimato.

= Habilidosos ou cúmplices? – eis uma outra questão, na medida em que somos confrontados com certas situações que nos fazem viver um tanto na desconfiança, mesmo da nossa própria sombra. Com efeito, nestes cerca de quarenta anos de democracia, em Portugal, temos tido a necessidade de ir criando algumas carrapaças de insensibilidade para com certas lamúrias, venham elas dos mais necessitados ou dos oportunistas, dos verdadeiros pobres ou dos que vivem à custa da subsidiodependência, em razão do trabalho ou de certos expedientes...

Numa muito típica posição portuguesa é muito fácil desconfiar da fortuna alheia, colocando-a, normalmente, sob suspeita e menos boa intenção, embora tentemos absolver as nossas conquistas com rasgos de boa sorte e de melhor habilidade... Quanta inveja é adulada na hora de julgar os outros! Quanta cobiça é exteriorizada nos momentos de falar dos outros! Quanta vaidade consome mentes e faz réus à nossa volta! Quanta ruindade povoa o mais íntimo de tanta gente com que nos cruzamos no nosso dia a dia!

 = Denunciar ou pactuar? – um modo desafio perante certas – e como sói dizer-se: determinadas – situações onde nem todos se assumem como favorecidos, mesmo que se sobreponham ardilosamente a outros e tão pouco se arrependem – isto poderá soar, no seu conceito jactante, a debilidade! – das mais díspares provocações aos que sofrem, verdadeiramente, as agruras da vida, mesmo que em silêncio e de forma envergonhada.

À boa maneira da nossa mentalidade lusa, somos capazes de proferir ‘acusações’ – mesmo sem provar, totalmente, o que é dito! – mas com grande dificuldade damos a cara pelas denúncias insinuadas. Que triste sina a nossa de termos de (quase) pactuar, inconscientemente, com certos cobardes! Que fado o nosso de, nacionalmente, vivermos à custa do menosprezo alheio, embora adulando aqueles que podem favorecer! Como poderemos crescer, efetivamente, se nos agigantamos na mediocridade coletiva?

Agora que temos estado mais ou menos em controlo económico, imposto pelas forças da troika, assim sejamos capazes de reformular os nossos critérios à luz do essencial e não daquilo que pouco ou nada vale!

A quem devemos favores? Como os vamos pagar? Com que meios? Qual o verdadeiro custo?

António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)

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