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quinta-feira, 2 de agosto de 2018

‘Deus, pátria e família’…


Quem ler ou escutar este tríptico poderá como que ser levado a pensar nessa promoção sócio/política do período anterior à revolução de abril/74.

Foi, em 1938 (há oitenta anos), que, surgiu este cartaz da ‘trilogia da educação nacional’, promovida pelo Estado Novo, sob o regime de António Salazar. Deste modo se pretendia exaltar a boa harmonia do novo regime vigente, em confronto com os distúrbios da primeira república – 1910-1926 – de tão nefastas consequências sociais, económicas e mesmo culturais.     

Oito décadas decorridas quantas mudanças na configuração europeia e mundial; quantas diabruras surgiram no mundo da política; quantas tropelias foram idealizadas e realizadas no âmbito nacional, internacional e transnacional; quantas mudanças rápidas ou lentas, revolucionárias ou ideológicas, ético/morais e quase metafísicas…

Se quisemos atender a algum daqueles itens aduzidos, o que ainda vai escapando mais ou menos é o da família, se bem que mesmo aqui ‘família’ tem múltiplos e imprevisíveis resultados, quase dependendo de quem fala para ser encontrar um projeto de família a gosto, a pedido ou à la carte.  

= Aquele tríptico – ‘Deus, pátria e família’ – estará tão desatualizado assim ou foram outras infiltrações que o fizeram torna-se, na visão e no comportamento de alguns, em algo de quase jurássico ‘cultural’ e como que um produto assaz antiquado? Não andaremos, antes, ao ritmo, dum regresso de adolescência – da sociedade em geral e de muitas pessoas em particular – a viver sob clichés manipuladores e tendencialmente anarquistas?  

Ao tempo em que ofender era tentar rotular de ‘fascista’, de direita, conservador, reacionário…agora diz-se, preferencialmente, ‘populista’, xenófobo, racista, homofóbico…numa tentativa em colocar fora da discussão quem possa ser obstáculo aos objetivos mais ou menos pretendidos, camuflados ou insinuados… Por vezes é tanto mais grave quando uma posição tomada por alguém esquerdista é classificada de progressista e ousada, enquanto a mesma atitude tida por alguém que não tenha essa conotação ideológica pode ser considerada de conservadora, antiquada e, sub-repticiamente, fundamentalista! 

= Talvez haja razões de mentalidade para termos chegado a esta sociedade onde ‘Deus’ se tornou uma espécie de arquétipo mítico/ancestral…sem memória nem história. Deus foi banido das questões da maioria das pessoas, que vivem como se Ele não existisse nem tenha mínimo lugar nas suas conjeturas. A perspetiva nietzscheriana: ‘Deus morreu, eu matei-o, mas não me sinto lá muito bem’…é cada vez mais um recurso cultural que povoa muitas mentes e vidas dos nossos contemporâneos. Ao vermos as atitudes e os comportamentos de tanta gente fica-nos a nítida sensação dum largo, profundo e altíssimo fosso onde muitos mergulham sem saída e sem nexo. Por isso, colocar Deus na esfera dos valores da maioria dos nossos coetâneos é como que usar uma linguagem sem compreensão nem suficiente valorização.

Por outro lado, não fossem as conquistas dos nossos futebóis e quase ninguém sentiria os eflúvios de nacionalismo – nalguns casos a roçar o bacoco bairrista e a lamechice inconsequente – ao escutarmos, a propósito e a despropósito, o hino nacional, numa tentativa de criar espírito de pátria e de comportamento de nação. Aí vemos, nem que seja por momentos de alienação coletiva, emergirem laivos dum povo que luta, esbraceja e, por vezes, conquista. Efetivamente os três sinais máximos de representação do nosso país – hino, bandeira e presidente – vão-se conjugando para remar para o mesmo lado da barricada, mesmo que esta possa estar empestada de lacaios, oportunistas e cobardes, hoje como ontem…

Não podemos deixar de continuar a refletir sobre esse outro aspeto que resta do tríptico citado: ‘família’. Mais do que um conceito sociológico em mutação, a célula básica da sociedade, sobretudo na linha da tradição judaico-cristã, precisa de ser analisada com olhos de futuro e não com nostalgia nem derrotismo. A família é e será sempre esse espaço de nascimento, de aprendizagem e de consolidação de cada pessoa, tendo em conta os valores, os critérios e os desafios permanentes a que está submetida. Com efeito, Deus cuida, a pátria alimenta e a família envia cada pessoa, em cada momento e numa contínua história de estórias…

 

António Sílvio Couto

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