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quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

O chocalho


Por decisão da Unesco, no passado dia um, na Namíbia, o chocalho – ou a ‘arte chocalheira’ – português foi declarado património cultural imaterial da humanidade com necessidade de salvaguarda urgente.

Esta arte é, predominantemente, exercida (fabricada e executada) no Alentejo… embora entendendo-se de Trás-os-Montes até aos Açores… Para alguns dos interessados em preservar esta arte, a classificação agora conseguida, pretende denunciar aquilo que não tem sido feito para que um certo mundo da pastorícia não morra!

= O que é um chocalho? Uma espécie idiofone (isto é, instrumento de percussão) em ferro forjado, colocado numa coleira ao pescoço dos animais (ovelhas ou gado bovino) contendo um badalo que emite sons que ajudam a localizar os animais… Embora tenham várias sonoridades, conforme a arte de fabrico, esta peça de artesanato torna-se, assim, em mais um motivo de salvaguarda da tradição e um grito contra o abandono do setor rural…em Portugal.

= Que tem (ou pode ter) este acontecimento a ver com a (nossa) situação política atual? Que coincidências haverá? Este fenómeno cultural que significado poderá ter para o resto da conjugação do país? Certas intervenções no mundo cultural não serão mais um arremedo da arte chocalheira… em risco? Que lições podemos tirar para o futuro próximo da Nação?

= Por que não acreditamos em coincidências, a classificação da Unesco do chocalho aconteceu no ‘dia 1 de dezembro’, dia da evocação da restauração da independência de Portugal do jugo castelhano. Ora, diante desta conjugação de datas, poderemos considerar que há muita gente – em tantos e variados campos – que faz muito barulho e pouco acrescenta à nossa identidade nacional. Pelo contrário, chama a atenção para dar a saber onde está, mas não se compromete na construção da mudança. Muitos lutam até atingirem o poder – usando todos os meios e sortilégios – e depois descansam nos benefícios. Com efeito, o cheiro do poder gera tal aconchego que até as ideologias mais extremistas se submetem à mais básica sedução…  

 

= Dizem que haverá pouco mais de uma dezena de artífices da ‘arte chocalheira’. Portanto, esta tradição está em vias de extinção como modo de vida. Ora, se, em Portugal, ainda houvesse outros tantos que fossem capazes de fabricar homens/mulheres com princípios, talvez ainda nos salvássemos deste lodaçal em que estamos a afundar-nos…a olhos vistos e sem perspetiva de mudança a curto prazo. Quantos ‘miguéis de vasconcelos’ (da restauração) proliferam nos gabinetes de tantas instâncias políticas! Quantos traidores se deixam seduzir por míseros vinténs e fazem calar a voz da consciência! Quantos estão, vistosos e radiantes, na hora da vitória e se vão tentando escapulir pelas portas dos fundos quando lhes cheira a certo de contas!

= De facto, seria muito útil regenerar as oficinas da ‘arte chocalheira’ em ordem a serem produzidos novos e mais sonoros chocalhos para serem colocados ao pescoço de tantos incompetentes e corruptos, de tantos enganadores e oportunistas, de tantos falsários e dissimuladores… A transumância pode começar…pela Assembleia da República… Que orquestra bela irá ser feita, neste imenso Portugal!

= Porque acreditamos que só a verdade vence, deixamos extravasar esta reflexão, pois acreditamos que ainda podemos construir um país mais humano porque mais fraterno e solidário. Agora que o tempo de Natal se aproxima não gostaríamos de ver continuada a sensação de que só nesta época se pensa nos mais desfavorecidos nem de que os governantes irão continuar a usar os seus concidadãos como peças de xadrez nos seus intentos mais subterrâneos…Que o chocalho nos acorde para a realidade nua e crua. Assim sejamos dignos desta arte ancestral e popular…

António Sílvio Couto



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