Há dias,
no calor da vitória, um treinador de futebol, dizia na televisão: ‘somos
[portugueses] um povo malandro’!... Ora, isto, dito em Itália, como que soava a
uma espécie de provocação e/ou a retratação da nossa habilidade em saber fintar
– muito para além da arte futebolística – as dificuldades da vida e de outros
obstáculos mais ou menos conscientes… do nosso eu pessoal e coletivo.
Em
muitas e diversas áreas nós, portugueses, temos sabido exercitar – umas vezes
de forma mais clara, noutras de modo mais habilidoso – esta arte de suplantar
as dificuldades. Há até quem nos admire a capacidade de desenrascanço, num
misto de inteligência e de esperteza, conseguindo mesmo iludir a falta de
meios, de recursos e de saberes.
À boa
maneira portuguesa vamos tentando adiar questões, que, na hora da verdade, têm
de ser resolvidas, mas que nem sempre se coadunam com a decisão de última hora
e nessa nossa tão característica subtileza de não ficarmos mal, pois pode(re)mos
cantar glória… depois de muita luta, suor e sangue.
Da
economia à política, do desporto (e não é só no futebol) à cultura, na área do
trabalho até às condições de sucesso, passando mesmo pelas expressões de fé e
de religião… vivemos muito – talvez demasiado – do improviso, suplantando o que
deveria ser assegurado com programação e planos de execução… com princípio,
meio e fim.
= Seremos capazes de mudar?
Agora
que temos de dar provas de que somos capazes de levar a cabo as tarefas de
pagarmos os empréstimos que nos concederam, temos de ser mais sistemáticos na
organização dos nossos projetos, conseguindo desfazer a impressão de não somos
capazes. Com efeito, tendo nós, portugueses, por essa Europa fora, a fama de
que somos bons trabalhadores – talvez dos melhores! – quando tudo está bem
organizado, temos de demonstrar que não somos mais ‘esse povo que vive no
noroeste da Península Ibérica, que não se governa nem se deixa governar’. Nós
temos qualidades quase únicas no mundo, pois sabemos adaptar-nos às mais duras
dificuldades e vencemos.
Já basta
de sermos vistos por tantos outros povos e culturas de que não somos capazes de
ultrapassar as barreiras que a própria língua nos condiciona, pois até somos
dos povos que melhor aprendem as línguas dos outros e que somos capazes de
vencer as barreiras da nossa condição de povo pequeno, pois temos uma grandeza
que muitos outros não apresentam: normalmente um português faz pontes e
raramente cria barreiras, antes promove o convívio e faz a alegria aparecer à
volta de um batuque ou sob a sonoridade de uns ferrinhos e/ou umas castanholas.
Quantos
emigrantes foram aprender – na diversidade das nações e culturas – a serem mais
abertos para que depois possam trazer outra abertura de mente e de compreensão
para com os seus conterrâneos. Por isso, não será em nada prejudicial que uma
nova vaga de emigrantes tenha saído, pois trarão novas ideias e – sendo gente
instruída e qualificada, segundo dizem! – saberá criar mais-valia para este
nosso país tão necessitado de boas ideias e de capacidade de empreendimento
coletivo.
Pelo
muito que temos feito em humanidade, nós, portugueses, precisamos de valorizar
mais as nossas boas práticas de convivência e de trabalho, mesmo que os que por
cá ficaram sejam ainda descendentes dos que não tiveram coragem de sair nas
caravelas dos Descobrimentos. Basta de ‘velhos do Restelo’, pois desses já
colhemos lições em excesso e, infelizmente, muitos deles continuam a pontificar
nas fileiras de vários partidos políticos, nas assembleias de muitas
organizações religiosas e até nas linhas e imagens de tanta comunicação social.
Pelo
muito que fomos, pelo tanto que somos e pela enormidade do que podemos ser, precisamos
de novos intérpretes para a nossa cultura, pois a visão ideológica de uns
tantos não pode sobrepor-se à inovação que urge fazer acontecer. Portugal
precisa, merece e conseguirá ser mais do que um ‘povo malandro’ nas conquistas
do desporto ou nas diatribes malfadadas do politicamente estar contra…
António
Sílvio Couto
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