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terça-feira, 6 de maio de 2014

Somos um povo malandro!


Há dias, no calor da vitória, um treinador de futebol, dizia na televisão: ‘somos [portugueses] um povo malandro’!... Ora, isto, dito em Itália, como que soava a uma espécie de provocação e/ou a retratação da nossa habilidade em saber fintar – muito para além da arte futebolística – as dificuldades da vida e de outros obstáculos mais ou menos conscientes… do nosso eu pessoal e coletivo.

Em muitas e diversas áreas nós, portugueses, temos sabido exercitar – umas vezes de forma mais clara, noutras de modo mais habilidoso – esta arte de suplantar as dificuldades. Há até quem nos admire a capacidade de desenrascanço, num misto de inteligência e de esperteza, conseguindo mesmo iludir a falta de meios, de recursos e de saberes.

À boa maneira portuguesa vamos tentando adiar questões, que, na hora da verdade, têm de ser resolvidas, mas que nem sempre se coadunam com a decisão de última hora e nessa nossa tão característica subtileza de não ficarmos mal, pois pode(re)mos cantar glória… depois de muita luta, suor e sangue.

Da economia à política, do desporto (e não é só no futebol) à cultura, na área do trabalho até às condições de sucesso, passando mesmo pelas expressões de fé e de religião… vivemos muito – talvez demasiado – do improviso, suplantando o que deveria ser assegurado com programação e planos de execução… com princípio, meio e fim.

= Seremos capazes de mudar?

Agora que temos de dar provas de que somos capazes de levar a cabo as tarefas de pagarmos os empréstimos que nos concederam, temos de ser mais sistemáticos na organização dos nossos projetos, conseguindo desfazer a impressão de não somos capazes. Com efeito, tendo nós, portugueses, por essa Europa fora, a fama de que somos bons trabalhadores – talvez dos melhores! – quando tudo está bem organizado, temos de demonstrar que não somos mais ‘esse povo que vive no noroeste da Península Ibérica, que não se governa nem se deixa governar’. Nós temos qualidades quase únicas no mundo, pois sabemos adaptar-nos às mais duras dificuldades e vencemos.

Já basta de sermos vistos por tantos outros povos e culturas de que não somos capazes de ultrapassar as barreiras que a própria língua nos condiciona, pois até somos dos povos que melhor aprendem as línguas dos outros e que somos capazes de vencer as barreiras da nossa condição de povo pequeno, pois temos uma grandeza que muitos outros não apresentam: normalmente um português faz pontes e raramente cria barreiras, antes promove o convívio e faz a alegria aparecer à volta de um batuque ou sob a sonoridade de uns ferrinhos e/ou umas castanholas.

Quantos emigrantes foram aprender – na diversidade das nações e culturas – a serem mais abertos para que depois possam trazer outra abertura de mente e de compreensão para com os seus conterrâneos. Por isso, não será em nada prejudicial que uma nova vaga de emigrantes tenha saído, pois trarão novas ideias e – sendo gente instruída e qualificada, segundo dizem! – saberá criar mais-valia para este nosso país tão necessitado de boas ideias e de capacidade de empreendimento coletivo. 

Pelo muito que temos feito em humanidade, nós, portugueses, precisamos de valorizar mais as nossas boas práticas de convivência e de trabalho, mesmo que os que por cá ficaram sejam ainda descendentes dos que não tiveram coragem de sair nas caravelas dos Descobrimentos. Basta de ‘velhos do Restelo’, pois desses já colhemos lições em excesso e, infelizmente, muitos deles continuam a pontificar nas fileiras de vários partidos políticos, nas assembleias de muitas organizações religiosas e até nas linhas e imagens de tanta comunicação social.

Pelo muito que fomos, pelo tanto que somos e pela enormidade do que podemos ser, precisamos de novos intérpretes para a nossa cultura, pois a visão ideológica de uns tantos não pode sobrepor-se à inovação que urge fazer acontecer. Portugal precisa, merece e conseguirá ser mais do que um ‘povo malandro’ nas conquistas do desporto ou nas diatribes malfadadas do politicamente estar contra…

 

António Sílvio Couto

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