Mais de
46 milhões de faturas elegíveis são candidatas ao carro da sorte – um Audi A4 –
que as Finanças vão sortear já em abril.
Para
entrar neste concurso bastou que, durante o mês de janeiro passado, o contribuinte
tenha pedido fatura no ato de compra/pagamento de algum produto, ficando
submetidas ao sorteio todas as faturas emitidas e comunicadas à Autoridade
Tributária e Aduaneira…não sendo necessária qualquer inscrição prévia!
- Embora
este meio de ‘educar’ o povo contribuinte possa ser questionado, parece que a
artimanha já começou a funcionar. Não deixa de ser inquietante que, ao balcão
das compras, nos acirrem com a pergunta: quer fatura com número de
contribuinte? Talvez tenhamos vivido demasiado à deriva em matéria de educação
financeira, pois fomo-nos habituando a tentar enganar quem nos exige que
façamos parte do bem comum e ao sabor dos nossos interesses mais ou menos
individualistas.
Se
atendermos que a (dita) economia paralela movimenta um quarto das
compras/vendas, serviços/transações, então, teremos de concordar que temos um
razoável caminho a fazer na consciencialização do nosso ‘eu coletivo’ como
nação, país e povo!
- Apesar
do aliciante de pode vir a ganhar um carro no valor de quase quarenta mil
euros, parece-nos que este engodo tem tanto de imoral, quanto de inoportuno,
pois, uma grande parte dos possíveis ganhadores do dito carro não terão
qualquer utilidade em obtê-lo, na medida em que os gastos em combustível
tornar-se-ão mais um fator de empobrecimento, de endividamento e até de superficialidade.
Não seria mais útil – como foi sugerido, por alguns pensantes, quando o tema
veio a público – entregar os prémios em géneros, sejam alimentares, sejam de
outra necessidade, que o ganhador poderia escolher a seu critério? Não
andaremos a enganar o ‘povo’ contribuinte com um novo-riquismo oco e sem
valores de prioridades? Não terá mais utilidade e equidade beneficiar em
redução de impostos quem tão sobrecarregado está em matéria de contribuições?
- Parece
que este ardil de sortear automóveis pelas Finanças terá um tanto a ver com uma
certa visão (ainda) retrógrada da mentalidade lusitana, pois o ‘carro’ já não é
mais só um bem de luxo, mas antes um veículo de trabalho. Por isso, os
governantes quase nos estão a qualificar – a todos e, particularmente, aos
contribuintes – como se fossemos uma espécie de bando de subdesenvolvidos que
veem no carro um artefacto de promoção. Também, em matéria de capital crítico
não ficamos – todos e cada um – bem tratados com a possibilidade de sermos
cumpridores das nossas obrigações só porque nos querem ganhar pelo prémio,
diga-se novamente, muito pouco digno para quem se diz instruído nas coisas das
ciências e das letras, mas talvez um tanto ignorante em questões éticas…
mínimas.
= Breves questões, desafios e
provocações
Diante
deste fenómeno social, que é o sorteio de um carro aos contribuintes
cumpridores das suas obrigações fiscais, como que sentimos alguns desafios e
provocações, que ousamos partilhar:
. Para
quando a valorização ética/moral do cumprimento do dever em vez da promoção da
falsidade, mesmo que possa render mais uns milhões aos cofres do Estado?
. Como
poderemos educar para a corresponsabilidade social e comunitária quem só cumpre
se for beneficiado (direta ou indiretamente) ou enquanto não seja descoberto na
sua manha?
. Até
onde irá (ou poderá e deverá ir) a participação das igrejas (comunidades e
religiões) nesta ação cívica e de promoção da cidadania?
. Não
teremos todos a ganhar em sermos mais sérios e bons cumpridores dos nossos
deveres?
Basta de
artimanhas e de subtilezas de mau gosto… Pela minha parte não quero participar
nesta farsa!
António
Sílvio Couto
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