É do mais elementar
bom senso que se dê ao povo – essa entidade quase anónima, mas com uma
personalidade colectiva muito bem definida – momentos de descontracção, de
festa ou de (inteligente) manipulação... Na panóplia de festas e de festanças vamos
vendo surgirem figuras e figurões, uns à sombra de santos e de heróis, outros sob
a condição de habilidosos e de concorrentes... eleitorais (autárquicos e não
só) e outros mais subtis na forma e no conteúdo... de contestação!
Mais do que falarmos
sobre os gastos das festas – muitos deles ultrapassando a capacidade económica
dos promotores, tanto na forma como no conteúdo – e do que tentarmos
descortinar os reais objectivos das festanças com a ‘cobertura’ de algum santo
ou santa, interrogamo-nos sobre a visão de fé (ou a falta dela!) com que são
realizadas certas festas ‘religiosas’ (as aspas já querem dizer alguma coisa!),
seja qual for a parte do país em que aconteçam ou que tenham a cobertura da matiz
religiosa... Agora vivo ao sul do Tejo e o modelo básico de ‘festa’ não difere
muito do que era e é feito no Minho, onde nasci e fui educado!
1. De facto, queremos
questionar – sobretudo no âmbito sócio-eclesial – as intenções de algumas
festas com algum patrocínio religioso e sob o alcance das temáticas cristãs...
mais ou menos assumidas, toleradas ou manipuladas.
Nesta época do ano
quase não há freguesia/paróquia/concelho/autarquia – a identificação começa a
diluir-se ao nível administrativo, mas não no âmbito religioso – que não faça a
sua festa... aproveitando o calor de verão e as necessidades dos fregueses/votantes:
até os santos/as se submetem aos interesses dos festejos... com Santa Luzia em
agosto e São Brás em setembro... para já não falar da senhora da Conceição em
junho e do santo António quando for mais rentável pela presença dos emigrantes!
De facto, o povo
precisa de festa, os mordomos/as de promoção – sobretudo neste ano de eleições
autárquicas e com outras misturas de interesses – as indústrias de pirotécnia
de ajuda, os cantores e cançonetistas de palco, os feirantes de oportunidade de
negócio... a Igreja de espaço para não cair no esquecimento... Tudo isto por
entre arremedos de (pretensa) crise e/ou de arrufos recessão.. senão para todos
ao menos para alguns mais lamentadores!
2. Há, no entanto,
sinais de vida de fé e de expressão católica, que não podem ser negligenciados,
se ainda tentarmos fazer de tais manifestações populares, oportunidades de
vivermos para além dos episódios de circunstância. Daquilo que vimos, vivemos e
sentimos, queremos propor:
- Que as procissões
sejam belas, simples e bem organizadas... não podendo outras manifestações (políticas
ou sindicais) serem melhores do que a honra, a veneração e o culto que
prestamos aos santos, a Nossa Senhora ou a Jesus, seja qual for a época ou a
circunstância... religiosa ou popular;
- Que mais do que o
desfile de pessoas e de adereços (minimamente) religiosos não tenham falta de
qualidade e de sentido de dignidade, tanto na forma como no conteúdo, para além
da mensagem;
- Que haja clareza
nos sinais de fé cristã, desde a cruz e a sua invocação comunitária até à
presença solene, simples e sincera da Palavra de Deus – pelo sermão, reflexão
adequada ou simples explicação dos santos e santas que integram o
desfile/procissão – numa linguagem compreensível, humilde a atraente... sem
panegíricos ou em agradecimentos dispensáveis... para dentro ou para fora do
contexto eclesial.
3. Mesmo que em tempo
(dito) de crise, as festas religiosas são úteis, necessárias e essenciais para
que haja identidade social, nacional e cultural de tudo e para todos. Assim as
façamos com sentido de fé... verdadeira!
Sobretudo em tempos
de crise é que o povo precisa de se divertir, não para se alienar, mas para
aliviar as agruras da vida e os sacrifícios que lhe estão adstritos. Assim,
façamos das festas religiosas espaços de convívio e de partilha!
Sem perder de vista a
necessidade de purificação de uns tantos ingredientes neo-pagãos, as festas
religiosas são oportunidade de abertura à fé, assim todos estejam conscientes
disso e o façam com dignidade... cultural!
António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com
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