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quarta-feira, 5 de junho de 2013

Do direito ao emprego... à obrigação do trabalho


Não deixa de ser interessante e, sobremaneira, preocupante que em vários quadrantes da nossa vida pública – social, sindical, política, financeira, religiosa e eclesial – se façam declarações de grande eloquência sobre o ‘direito ao trabalho’, como claúsula de um articulado de regras e de prerrogativas constitucionais. Há números e estatísticas – para todos os gostos e feitios, sensibilidades e correntes – sempre reclamando o direito ao trabalho, mas quase nunca se fala da obrigação em trabalhar, tanto como vocação e até missão.

Nota-se nalgumas cabeças e, sobretudo, no comportamento de certas pessoas, alguma confusão entre ‘emprego’ e ‘trabalho’, fazendo com que este seja subjugado por aquele, embora reclamando do grande direito ao trabalho... sabe lá com que custo. Há conceitos que têm uma forte conotação ideológica e, em muitos casos, o ‘trabalho’ tem sofrido de uma leitura marcadamente ideológica e com razoável matiz marxista, senão de forma explícita, pelo menos de modo tácito.

Diante desta breve distinção poderemos apresentar algumas questões – pois fazer afirmações poderá suscitar outros problemas – e mesmo sugestões, onde trabalho e emprego se entrecruzam, embora não se possam excluir, mas antes complementar.

- Que dizer do trabalho voluntário se não é – teoricamente – emprego, mesmo que ocupando o tempo de tantas pessoas?

- Como se poderá classificar a acção de tantos intervenientes – como por exemplo as mães nos trabalhos domésticos ou os cuidados de alguém debilitado na saúde e pela idade – em que não há dinheiro algum que paga a trabalho executado?

- Em quantas situações há dedicação a um trabalho de ajuda aos outros e, muitas vezes, a paga é um sorriso ou uma simples palavra de agradecimento, como ‘obrigado’, ‘Deus lhe pague’, etc.

- Em quantos momentos da nossa vida te(re)mos já vivido a sensação de termos participado em acções em favor dos outros e, nas quais, o trabalho realizado motiva outros, os faz crescer e, sem nos darmos conta, contribuímos para a valorização daqueles/as que Deus põe no nosso caminho.

Num tempo tão marcado pelo egoísmo – pessoal, de classe, de grupo ou de lóbi, de auto-adulação ou mesmo de interesseirismo – as questões do trabalho confundem-se com matéria de valores, de questões éticas, mesmo de ideais e, porque não ainda, de critérios espirituais.

. Quando vemos serem marcadas greves – sobretudo em sectores como os transportes, a saúde, a educação, a segurança ou rotuladas de ‘gerais’ – como que sentimos que os interesses alheios são tantas vezes sonegados às reivindicações ou até aos despiques ideológicos... num ritmo de protagonismo em vista de ascensão ao poder, a curto ou médio prazo. A quem interessa afundar mais o país? Como se poderá criar riqueza ou cativar investimento se não há tranquilidade social? Quem nos vê em (tantos) desfiles e (múltiplas) manifestações – num ritual cíclico e orquestrado -- ter-nos-ão, por essa Europa fora, por trabalhadores ou, antes, por fomentadores do emprego sem esforço no trabalho? Quando os nossos trabalhadores emigram são dos melhores, porque razão lá fora produzem e aqui não se vê idêntica categorização do trabalho efectuado? Será uma questão de estatuto social ou antes de mentalidade nacional?

. Quando vemos aumenta a tensão social – estamos entre os sete países do mundo com maior tensão, diz a OIT – fica-nos a sensação de que os factores de produção estão em risco e quem pode querer investir o seu dinheiro – seja qual foi o capitalismo ou a máscara de neo-liberalismo – não nos terá em boa conta. Neste momento histórico Portugal caminha para a radicalização dos actos, pois a das palavras já não pode crescer mais... Os incendiários sociais – alguns deles deveriam calar-se ou serem calados – terão interesses não claros, mas o bom senso é preciso, mesmo entre as figuras eclesiásticas com maior ou menor relevo. Denunciar tem um tempo, enquanto a dimensão profética só se valoriza quando faz crescer o compromisso com a paz e a harmonia... Estar de braços cruzados e muitos menos de punhos cerrados não resolve nada, pois o grande Profeta (Jesus) construiu algo de novo de braços abertos, na Cruz... para sempre!

António Sílvio Couto


 

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