As
virtudes teologais [da fé e da caridade] «estão
intimamente unidas, e seria errado ver entre elas um contraste ou uma
«dialética». Na realidade, se, por um lado, é redutiva a posição
de quem acentua de tal maneira o caráter prioritário e decisivo da
fé que acaba por subestimar ou quase desprezar as obras concretas da
caridade reduzindo-a a um genérico humanitarismo, por outro é
igualmente redutivo defender uma exagerada supremacia da caridade e
sua operatividade, pensando que as obras substituem a fé. Para uma
vida espiritual sã, é necessário evitar tanto o fideísmo como o
ativismo moralista».
Diz-nos o
Papa Bento XVI na sua mensagem para a Quaresma deste ano, intitulada:
‘Crer na caridade suscita caridade’.
À
luz desta mensagem papal respigaremos alguns excertos, tentando
dar-lhes conteúdo em ordem a viver como momento de fundamental
importância a caminhada da quaresma de 2013.
=
Evangelização: obra de caridade
‘Por
vezes tende-se a circunscrever a palavra «caridade» à
solidariedade ou à mera ajuda humanitária; é importante recordar,
ao invés, que a maior obra de caridade é precisamente a
evangelização, ou seja, o «serviço da Palavra»’.
Quando
vemos tantas sugestões de humanitarismo sob a capa de solidariedade
e com inúmeros intervenientes a fazerem da ajuda que prestam uma
espécie de prolongamento do seu egoísmo, este pensamento do Papa
traz-nos arrepios sobre certas iniciativas filantrópicas desfasadas
do bem dos outros. Com efeito, vão surgindo intervenções –
pessoais ou de grupos, ocasionais ou organizadas – que parece que
mais não fazem dos beneficiados do que gente presa pela boca –
numa espécie de política de anzol! – em vez de lhes darem
capacidade para serem pessoas com asas, com critérios e com
projectos de conduta... para o futuro, sendo capazes de agradecer,
mas não de pedinchar... continuamente.
-
Precisamos de profetas – isto é, ‘boca de Deus’ – que sejam
capazes de dar o pão de cada dia porque foram capazes de descobrir
que temos um Pai comum, que nos faz estar atentos aos outros,
socorrendo-os e alimentando-os com o Pão da Palavra e com o Pão
para o corpo...
-
Precisamos de profetas que tenham fé adulta para saberem distinguir
entre quem é necessitado ou quem é oportunista... mesmo que
aviltando-se na sua dignidade, mas sem qualidade humana e moral.
-
Precisamos de profetas de boca limpa, de mãos sujas e de espírito
aberto para serem capazes de dizer a mensagem do Evangelho, de saber
conhecer os problemas e de resolvê-los, tendo capacidade de
discernir onde está a verdade ou por onde passa o disfarce... seja
ele de quem quer que seja!
=
Evangelização: promoção integral da pessoa humana
‘Não
há acção mais benéfica e, por conseguinte, caritativa com o
próximo do que repartir-lhe o pão da Palavra de Deus, fazê-lo
participante da Boa Nova do Evangelho, introduzi-lo no relacionamento
com Deus: a evangelização é a promoção mais alta e integral da
pessoa humana’.
A
fome não tem religião: é verdade; mas não é menos verdade que,
se não fosse a religião – seja qual for a sua denominação! –
haveria muita mais fome... no mundo e, em particular, em Portugal! De
facto, as grandes religiões têm nos seus princípios fundamentais e
fundacionais o dever de assistência aos mais desfavorecidos, seja
pela prática da esmola, seja pela atitude de assistência nos
momentos de maior debilidade... dos outros.
Valerá
a pena lembrar a troca de palavras entre Madre Teresa de Calcutá e
um jornalista que lhe dizia: ‘eu não seria capaz de tratar de um
leproso nem que fosse por um milhão de dólares’. Ao que Madre
Teresa respondeu: ‘nem eu... mas por amor faço isso e muito mais’!
Muito
mal irá qualquer acção sócio-caritativa que não seja capaz de
fazer de cada usufrutuário – há quem lhe chame agora ‘cliente’
– um intérprete activo da sua história, sacudindo as peias do
assistencialismo e ganhando interesse pela sua valorização
cultural.
Terminamos
acentuando os votos com que o Papa Bento XVI conclui a sua mensagem
quaresmal: ‘neste
tempo de Quaresma, em que nos preparamos para celebrar o evento da
Cruz e da Ressurreição, no qual o Amor de Deus redimiu o mundo e
iluminou a história, desejo a todos vós que vivais este tempo
precioso reavivando a fé em Jesus Cristo, para entrar no seu próprio
circuito de amor ao Pai e a cada irmão e irmã que encontramos na
nossa vida’.
Mostremos
pela caridade a força da fé, que procuramos viver em Igreja
católica!
António
Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)
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