Queiram desculpar, neste texto, a
referência a uma vivência pessoal muito próxima com aquilo que pode parecer um
tanto indiscreto... embora o nosso intuito seja de partilha e de reflexão e não
de lições.
Faleceu, por estes dias, uma tia
materna. Tinha oitenta e cinco anos. São cinco irmãos, quatro raparigas e um
rapaz... todos na ordem dos oitenta anos. Nascidos na região de Braga, foram
para o concelho de Esposende, após o falecimento de um tio padre, que levara o
irmão como companhia para a paróquia onde esteve. Nascidos da relação
matrimonial do irmão do padre com uma senhora de uma casa importante da
terra... a mãe gostava, afinal, de outro senhor. Logo, após a morte do padre,
ela desapareceu, tendo o pai ‘viúvo’ regressado à terra natal com cinco filhos
para criar... Estamos no tempo da segunda guerra mundial! A saga de austeridade
– como agora se diz com arrepios e uma certa má vontade! – percorreu estas
vidas, tendo cada qual passado a servir em casa de lavradores da época. Chegada
a hora de casar cada um seguiu a sua vida... embora com a tristeza (talvez seja
até trauma!) da ausência da mãe, só descoberta mais de trinta anos depois, na
zona de Famalicão.
Esta tia, agora falecida, ficou
viúva com a idade de trinta anos, tendo o marido sido trucidado por um comboio
em Viana do Castelo. Os quatro filhos (dois e duas) viveram as agruras desse
tempo, saindo, mais tarde, uns para a tropa e outras para trabalhos na região
de Lisboa. Especialista na arte de cestaria, esta tia, agora falecida, foi
vendo as outras irmãs ficarem viúvas também... passando também alguns dos
filhos destas, naturalmente, dificuldades de natureza económica. Houve quem
estudasse, valorizando-se e quem tenha sido até ministro deste país, enquanto,
no meu caso, foi-me concedida a graça do sacerdócio ministerial... quase todos
os filhos e filhas destas irmãs conseguiram vingar na vida, embora alguns
tenham perecido muito cedo...
Quando ouvimos certas figuras –
políticas, sindicais, partidárias ou até eclesiais – reclamarem das condições
de vida atual, como que sentimos alguma repulsa, pois esses tais reclamantes
talvez nunca tenham passado fome e privações, talvez nunca tenham andado de
roupa consertada ou ido a pé e descalço para a escola, talvez não tenham
chorado ou visto chorar por não haver mínimas condições de habitação, talvez
não tenham sofrido por não poderem dar aos pais melhores momentos de alegria,
talvez, numa palavra: não tenham aprendido a serem acrisolados na escola da
austeridade, que não nos deixou – tanto quanto é possível ver! – azedos ou
contestatários, mas gratos por tantos sacrifícios com que fomos educados!
Queira Deus dar a recompensa a todas estas mães que tão varonilmentede de nós
cuidaram!
= Desafios pessoais e virtudes sociais
Porque não queremos ficar na
vertente meramente fechada do que vivemos, mas, antes, pretendemos alargar os
horizontes, ousamos sugerir:
- Pais não deem aos vossos filhos
aquilo que não tiveram na idade de serem como eles nem tentem suprir os laços de
afeto com coisas não solicitadas;
- Filhos não exijam aos vossos
pais aquilo que, nesta hora de dificuldade, não conseguem dar-vos, pois
fazem-nos sofrer se vos virem tristes pelo seu menos bom desempenho para
convosco;
- Fazedores da comunicação social
não excitem as turbas com notícias de perturbação, mas tentem informar sem
manipular, pois a técnica pode voltar-se, a curto prazo, contra vós mesmos;
- Promotores das modas – sejam
elas de roupa ou de ideias, sejam de modelo de comportamento ou de propostas de
reivindicação – ajudem os vossos alvos a tornarem-se conscientes da verdade e
não façam da manipulação uma arma de vingança;
- Senhores do dinheiro –
banqueiros ou capitalistas, negociadores ou chantagistas – tentem usar a vossa
fama e poder de persuassão para dirimir conflitos e não para os agravarem, pois,
um dia, pode ser que os vossos intentos revertam contra vós e o veneno que
usastes será ainda mais mortífero.
Porque acreditamos na força dos
valores do Evangelho, agradecemos a todos quantos no-los ensinaram e esperamos,
hoje, sermos bons difusores dos mesmos pelo testemunho de vida!
António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)
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