
Um dado digno de registo, tendo em conta aquele relatório, é o que se refere à conivência (ou será antes, conluio?) entre membros do governo e certos gabinetes de advogados, bem como à (pretensa) declaração de rendimentos dos titulares de cargos públicos, com a incumbência de fazerem tal declaração no início e no fim de cada mandato e não anualmente, como era habitual... para que possa haver clareza de meios e de fins.
= ‘Ser esperto ou
parecer sério’? – eis a questão que poderia ocupar-nos numa reflexão mais ou menos
simplista. De fato, como que vivemos num estado de suspeita sobre quem ocupa
(ou pretenda candidatar-se) algum cargo de teor político, sobretudo, se for
remunerado, de forma direta ou indireta. De muitos e variados modos se faz cair
um certo labéu sobre quem está na vida política, extrapolando de casos pequenos
para a generalidade de todos... numa muito desagradável acusação sobre
competentes e prevaricadores, de honestos e corruptos, de gente de bem e uns
tantos menos bons...
Sem nos
darmos conta como que colocamos ao mesmo nível pessoas sérias e desonestas, que
certamente as há, pois, certas anormalidades não acontecem por arte do acaso, mas
antes têm de ter sujeitos e operacionais, tenham eles rostos ou se escondam sob
a capa do anonimato.
= Habilidosos ou
cúmplices? –
eis uma outra questão, na medida em que somos confrontados com certas situações
que nos fazem viver um tanto na desconfiança, mesmo da nossa própria sombra. Com
efeito, nestes cerca de quarenta anos de democracia, em Portugal, temos tido a
necessidade de ir criando algumas carrapaças de insensibilidade para com certas
lamúrias, venham elas dos mais necessitados ou dos oportunistas, dos
verdadeiros pobres ou dos que vivem à custa da subsidiodependência, em razão do
trabalho ou de certos expedientes...
Numa
muito típica posição portuguesa é muito fácil desconfiar da fortuna alheia,
colocando-a, normalmente, sob suspeita e menos boa intenção, embora tentemos
absolver as nossas conquistas com rasgos de boa sorte e de melhor habilidade...
Quanta inveja é adulada na hora de julgar os outros! Quanta cobiça é
exteriorizada nos momentos de falar dos outros! Quanta vaidade consome mentes e
faz réus à nossa volta! Quanta ruindade povoa o mais íntimo de tanta gente com
que nos cruzamos no nosso dia a dia!
À boa maneira da nossa mentalidade lusa, somos capazes de proferir ‘acusações’ – mesmo sem provar, totalmente, o que é dito! – mas com grande dificuldade damos a cara pelas denúncias insinuadas. Que triste sina a nossa de termos de (quase) pactuar, inconscientemente, com certos cobardes! Que fado o nosso de, nacionalmente, vivermos à custa do menosprezo alheio, embora adulando aqueles que podem favorecer! Como poderemos crescer, efetivamente, se nos agigantamos na mediocridade coletiva?
Agora que temos estado mais ou menos em controlo económico, imposto pelas forças da troika, assim sejamos capazes de reformular os nossos critérios à luz do essencial e não daquilo que pouco ou nada vale!
A quem
devemos favores? Como os vamos pagar? Com que meios? Qual o verdadeiro custo?
António Sílvio Couto
(asilviocouto@gmail.com)