O ‘imposto sobre valor acrescentado’ nos bilhetes das ‘corridas de toiros’ (vulgarmente ditas de touradas) vai baixar da taxa máxima, de 23%, para a reduzida, de 6%, no próximo ano. A proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2025 (OE 2025) foi aprovada pelos partidos do governo e com o apoio de outro partido apelidado de direita e ainda de outro de esquerda minoritária e com a abstenção do maior partido da oposição – na vigência da sua governança tinha-a tornado no valor máximo – e os votos contra dos restantes partidos.
1. As razões aduzidas para esta mudança situa-se na classificação de que os espectáculos tauromáquicos são considerados como atividade cultural e que, portanto, não podiam ser discriminados com a taxa mais elevada. O custo prático da medida de redução de 23 para 6% foi calculado, por quem supervisiona o orçamento de estado, com a quebra das receitas de cerca de 115 mil euros anuais nos cofres estatais.
2. Diante desta medida algo surpreendente, dado que só atinge uma pequena parcela da população, os ditos ‘aficionados’, podemos e devemos fazer um enquadramento dos principais artigos que são taxados com seis por cento de IVA. No topo da lista estão: A) os produtos alimentares – cereais e preparados à base de cereais; carnes (várias), peixes e moluscos (peixe fresco e conservas), leite, laticínios e ovos, gorduras e óleos gordos (azeite e banha), frutas, legumes e produtos hortículas, águas (à exceção das de nascente e minerais), mel, sal, sumos e néctares de frutos, produtos dietéticos. B) das quarenta e uma situações apresentadas destacamos: livros, jornais e publicações periódicas (científicas, educativas, desportivas); produtos farmacêuticos e similares e respetivas substâncias ativas; aparelhos ortopédicos, cintas médico-cirúrgicas e meias medicinais, cadeiras de rodas e veículos semelhantes; utensílios e outros equipamentos exclusiva ou principalmente destinados a operações de socorro e salvamento; prestações de serviços de assistência domiciliária a crianças, idosos, toxicodependentes, doentes ou deficientes; entradas em espetáculos de canto, dança, música, teatro, cinema, circo, entradas em exposições, entradas em jardins zoológicos, botânicos e aquários públicos… C) Bens utilizados normalmente no âmbito das atividades de produção agrícola e aquícola (adubos, fertilizantes, sementes, forragens)…
3. Que dizer desta longa lista de produtos, de situações e de serviços, em comparação com a ‘importância’ das questões tauromáquicas? Não andará algo subvertido na hierarquia das questões e na referência cultural das mesmas? Quais foram os lóbis que intervieram para que se desse essa mudança mais simbólica do que até económica? Não revelará isto que vivemos num país em ritmos diferentes ou que certas bolhas socioculturais impõem-se mesmo que de forma não sensata nem honesta? A quem interessa que se exponham estas discrepâncias regionalistas e quase em circuito fechado?
4. Se esta matéria das ‘corridas de toiros’ (vulgarmente ditas de touradas), feitas à porta fechada e com cobrança de entrada fossem levadas a referendo seria, em princípio, daqueles que não votaria contra a sua realização, embora isso não me diga absolutamente nada como expressão (dita) cultural. No entanto, considero que se deva salvaguardar a possibilidade de que tais ‘espetáculos’ tenham condições mais humanas e dignas nas lides dos animais. Com efeito, não será pela repressão, mas pela educação séria, serena e progressiva, que as mentalidades se irão modificando…lentamente.
5. Depois de tanta discussão à volta do OE2025 fica a sensação de que ainda há muito dinheiro de sobra – será excedente ou terá outro segredo de designação – para distribuir em benesses de interesses mais ou menos claros. Eis que, de repente, vemos uma espécie de bodo-aos-pobres em que uns tantos reivindicam, exigem e fazem aprovar matérias que lhe poderão, num futuro próximo, valer como argumentos em favor dos seus apoiantes ou simpatizantes. Será isto governar? Até onde irá este clima de recebe mais, quem mais grita?
António Sílvio Couto
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