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terça-feira, 3 de dezembro de 2024

Síndrome de húbris – doença do poder

 


‘Síndrome de húbris’ – também conhecida por síndrome da presunção – corresponde a um padrão de comportamento provocado pela exposição a um cargo de poder, que se reflete pelo transtorno de personalidade de homens e de mulheres impulsivos e imprudentes devido aos seus ímpetos autoritários e de quase desequilíbrio emocional.

Talvez esta expressão possa explicar ou ajudar a compreender tantos dos comportamentos que vemos à nossa volta, mesmo sem disso nos darmos totalmente conta… na política, na vida social, na vivência religiosa e até nas atitudes de foro económico-financeiro.

1. Expliquemos os termos e aclaremos os conceitos. O termo ‘húbris’ é um conceito grego que significa “excesso,” numa tradução ao sentido como tudo aquilo que passa da medida, como arrogância exagerada ou insolência em demasia. Com efeito, na mitologia grega eram atitudes consideradas afrontosas contra os deuses e acabavam em punição, enquanto na civilização romana a ‘húbris’ era vista como “petulância” de homens que sucumbiam a um desfecho desonroso.

2. Não será que a linguagem popular portuguesa tem algo de aproximado a esta expressão mais erudita e sanitária: se queres conhecer o vilão coloca-lhe o pau (mando, poder) na mão? De facto, é recorrente ouvir-se: o poder corrompe e ser este for absoluto deixa ainda mais marcas. De quantas formas e tantas modalidades podemos ver pessoas que abusam do poder – pouco ou mais expressivo – e encontramos tantos tiques de que pisa os outros, depreciando-os ou inferiorizando-os. Diz-se que a ‘síndrome de húbris’ tem início na megalomania e termina na paranoia…

3. Este comportamento será melhor avaliado se colocado sob a alçada de alguém da esfera da saúde, tanto psicólogo como psiquiatra. Na busca para compreender este tema encontrei várias caraterísticas da ‘síndrome de húbris’. Elencamos algumas: uma propensão narcísica para ver o mundo em primeiro lugar como uma arena para exercer o poder e procurar a glória. Predisposição para fazer coisas de forma a melhorar a sua imagem. Uma preocupação desproporcionada com a imagem e a apresentação (egocentrismo), sendo a ostentação e o luxo os seus melhores aliados. Tendência para falar de si na terceira pessoa ou uso do plural majestático. Confiança excessiva no seu próprio julgamento e condescendência em relação aos conselhos ou críticas dos outros. Crença exagerada em si mesmo, na fronteira da sensação da omnipotência. Perda de contato com a realidade, muitas vezes associado a isolamento progressivo. Inquietude permanente, indiferença e impulsividade… Talvez uma pessoa com a ‘síndrome de húbris’ acumule mais do que umas destas caraterísticas… Numa leitura um tanto excessiva desta síndrome poderemos considerar domo cúmulo da incompetência hubrística: as coisas começam a correr mal por causa do excesso de confiança e ele nem se preocupa com as dissidências.

4. Embora isto não explique nem justifique social e eticamente as atitudes de tantos do que estão na vida pública – que devia ser de serviço e não só de poder – poderemos entender melhor a ausência de pessoas capazes de liderança, embora se considerem e sejam chefes. Qual a diferença entre chefe e líder? Chefe é uma pessoa que comanda um grupo, um departamento ou uma organização, está investido de poder para a tomada de decisões e é procurado para a solução de problemas. Líder também está à frente de um grupo, departamento ou organização, mas as suas ações influenciam o comportamento das outras pessoas para que os resultados sejam alcançados da melhor maneira possível, sobretudo envolvendo os outros nas decisões e nas soluções.

5. Muito mal estaria uma organização ser o líder sofresse da ‘síndrome de húbris’, embora vejamos muitos investidos em chefia que sofrem claramente desta síndrome, mesmo sem disso se darem conta, mas os outros pagarão muito paga essa fatura…




António Sílvio Couto

Taxa reduzida (6%) nas ‘corridas de toiros’

 

O ‘imposto sobre valor acrescentado’ nos bilhetes das ‘corridas de toiros’ (vulgarmente ditas de touradas) vai baixar da taxa máxima, de 23%, para a reduzida, de 6%, no próximo ano. A proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2025 (OE 2025) foi aprovada pelos partidos do governo e com o apoio de outro partido apelidado de direita e ainda de outro de esquerda minoritária e com a abstenção do maior partido da oposição – na vigência da sua governança tinha-a tornado no valor máximo – e os votos contra dos restantes partidos.

1. As razões aduzidas para esta mudança situa-se na classificação de que os espectáculos tauromáquicos são considerados como atividade cultural e que, portanto, não podiam ser discriminados com a taxa mais elevada. O custo prático da medida de redução de 23 para 6% foi calculado, por quem supervisiona o orçamento de estado, com a quebra das receitas de cerca de 115 mil euros anuais nos cofres estatais.

2. Diante desta medida algo surpreendente, dado que só atinge uma pequena parcela da população, os ditos ‘aficionados’, podemos e devemos fazer um enquadramento dos principais artigos que são taxados com seis por cento de IVA. No topo da lista estão: A) os produtos alimentares – cereais e preparados à base de cereais; carnes (várias), peixes e moluscos (peixe fresco e conservas), leite, laticínios e ovos, gorduras e óleos gordos (azeite e banha), frutas, legumes e produtos hortículas, águas (à exceção das de nascente e minerais), mel, sal, sumos e néctares de frutos, produtos dietéticos. B) das quarenta e uma situações apresentadas destacamos: livros, jornais e publicações periódicas (científicas, educativas, desportivas); produtos farmacêuticos e similares e respetivas substâncias ativas; aparelhos ortopédicos, cintas médico-cirúrgicas e meias medicinais, cadeiras de rodas e veículos semelhantes; utensílios e outros equipamentos exclusiva ou principalmente destinados a operações de socorro e salvamento; prestações de serviços de assistência domiciliária a crianças, idosos, toxicodependentes, doentes ou deficientes; entradas em espetáculos de canto, dança, música, teatro, cinema, circo, entradas em exposições, entradas em jardins zoológicos, botânicos e aquários públicos… C) Bens utilizados normalmente no âmbito das atividades de produção agrícola e aquícola (adubos, fertilizantes, sementes, forragens)…

3. Que dizer desta longa lista de produtos, de situações e de serviços, em comparação com a ‘importância’ das questões tauromáquicas? Não andará algo subvertido na hierarquia das questões e na referência cultural das mesmas? Quais foram os lóbis que intervieram para que se desse essa mudança mais simbólica do que até económica? Não revelará isto que vivemos num país em ritmos diferentes ou que certas bolhas socioculturais impõem-se mesmo que de forma não sensata nem honesta? A quem interessa que se exponham estas discrepâncias regionalistas e quase em circuito fechado?

4. Se esta matéria das ‘corridas de toiros’ (vulgarmente ditas de touradas), feitas à porta fechada e com cobrança de entrada fossem levadas a referendo seria, em princípio, daqueles que não votaria contra a sua realização, embora isso não me diga absolutamente nada como expressão (dita) cultural. No entanto, considero que se deva salvaguardar a possibilidade de que tais ‘espetáculos’ tenham condições mais humanas e dignas nas lides dos animais. Com efeito, não será pela repressão, mas pela educação séria, serena e progressiva, que as mentalidades se irão modificando…lentamente.

5. Depois de tanta discussão à volta do OE2025 fica a sensação de que ainda há muito dinheiro de sobra – será excedente ou terá outro segredo de designação – para distribuir em benesses de interesses mais ou menos claros. Eis que, de repente, vemos uma espécie de bodo-aos-pobres em que uns tantos reivindicam, exigem e fazem aprovar matérias que lhe poderão, num futuro próximo, valer como argumentos em favor dos seus apoiantes ou simpatizantes. Será isto governar? Até onde irá este clima de recebe mais, quem mais grita?



António Sílvio Couto