Decorridos quase cinquenta anos sobre a efeméride ainda há quem não consiga perceber o significado da data de ’25 de novembro de 1975’, como uma segunda etapa do que aconteceu em abril de 74. Embora haja quem compreenda o significado do ’25 de novembro’, outros continuam aferrados aos seus preconceitos, mesmo que a expressão eleitoral se venha a tornar quase residual... o tempo passa e as convicções deixam a nu a falta de razão.
1. Um dos arietes do ’25 de novembro’ foi Ramalho Eanes, comandante operacional do acontecimento e que foi presidente da República entre 1976-1986. Será útil recordar o que ele disse e escreveu sobre esta data em apreço. «Não percebo que estigmatizem o 25 de Novembro, porque o 25 de Novembro é a continuação do 25 de Abril; é a reafirmação de que as promessas feitas pelos militares à população portuguesa se mantêm, e se mantêm com toda a força, seja como for, quaisquer que sejam os obstáculos”. É altura de reconhecer que “houve um período muito complicado entre o 25 de Abril e o 25 de Novembro, que houve movimentos que tentaram – compreensivelmente, em minha opinião – impor as suas ideologias, o que, obviamente, o MFA não permitiu, porque isso seria, de alguma maneira, contrariar, não responder, não respeitar a promessa de Abril. E portanto, tivemos de fazer o 25 de Novembro, mas, a partir daí, o país criou unidade, unidade plural, obviamente... Entendo que o esquecimento do 25 de Novembro não ajuda a democracia, porque a história não se apaga. É com a história, e regressando à história, de forma não endémica nem nostálgica, que aprendemos a evitar erros futuros»
2. Quem assim se exprime sabe daquilo que fala e deve-nos fazer tomar consciência de que pode haver erros, exageros e tropelias, mas também podem ser corrigidos, atenuados ou servirem-nos de lições para o futuro. Foi isso que o ’25 de novembro’ quis operar. Com efeito, a maioria dos deputados assentados no atual parlamento eram, pelo menos imberbes, à data da revolução de abril. Uns tantos – e no feminino também – são filhos dos que desenvolveram o PREC, entre assaltos e atentados, com brigadas revolucionárias e acusações de capitalismo... afundando empresas e atirando para o desemprego os seus apaniguados. Alguns contestaram a adesão à União Europeia e a pertença ao euro, mas usufruem boas maquias quando são deputados no Parlamento Europeu.
3. Recordemos, por isso, sucintamente alguns dos acontecimentos ocorridos nos dezanove meses entre o ’25 de abril de 74’ e o ’25 de novembro de 75’. Datas como o ‘11 de março’ ou o ‘28 de setembro’, sem esquecer os comícios inflamados em certas zonas da ‘margem sul’ do Tejo, a destruição da Rádio Renascença... com a resposta das manifestações em Braga, em frente à Sé catedral, a cadeia de limpeza de certas sedes partidárias, a avalanche de cidadãos (rotulados) de ‘retornados’, as emboscadas e rusgas arbitrárias em várias zonas do país, as perseguições e confrontos por ocasião da ordenação do primeiro bispo de Setúbal, em outubro de 1975... são alguns dos acontecimentos que perfizeram o hiato entre o ‘25 de abril de 74’ e o ‘25 de novembro de 75’. Varrer para debaixo do tapete da História esses factos – nalguns casos com forte repercussão em famílias e sociedades – seria esconder algo que traumatizou o país...irremediavelmente.
4. O ’25 de novembro’ não foi nem pode ser a esponja sobre algumas das malfeitorias de pessoas que agora têm medo que se descubra o passado pessoal e familiar. Não podemos continuar a tratar como heróis figuras que contribuiram – e desgraçadamente ainda hoje – para o retrocesso do país só porque querem ficar nos louros revolucionários da adolescência. Basta de afrontas. Assumam o que fizeram e deixem que o país real caminhe para o desenvolvimento. Quando serão responsabilizados pelas fábricas que fizeram ruir e levaram para o desemprego tantos que os seguiram acriticamente? A história não se reescreve como faziam noutras paragens que eles queriam impor em Portugal e que o ’25 de novembro’ corrigiu... A verdade, sempre!
António Sílvio Couto