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sexta-feira, 20 de setembro de 2024

‘Depois, não se queixe’ Causas – culpados – consequências

 

Parece ter entrado na linguagem corrente uma expressão usada num programa televisivo de tendência judicial a expressão – ‘depois, não se queixe’ – em que aquele que faz de ‘juiz’ (ao que consta reformado da atividade) adverte os contendores para o bom senso e o uso correto da própria justiça, sem exageros nem abusos.

Vem isto a propósito da mais recente onda de fogos florestais – vulgo incêndios – onde se mescla um conjunto de situações, que urge detetar, perceber e mesmo corrigir: as causas, os culpados e as consequências… de tudo isto que tem tanto de grave quanto de questionável.

1. Causas dos incêndios – de muitas e variadas formas se vai falando das causas, umas de forma clara e assumida e outras quase em surdina e com meias palavras (suposições, acusações e até preconceitos) numa complexidade em que todos ficam a perder e poucos saem beneficiados. A razão dos incêndios é a falta de limpeza das matas e montes? Onde estão os proprietários para lhes cobrem a multa? Não andarão por ‘lisboa e vale do tejo’ usufruindo das regalias de viverem como urbanos, desprezando os rústicos? As alterações climáticas conseguem arcar com a responsabilidade da mudança de condições a destempo? Ainda se irá a tempo de corrigir os destemperos e atrocidades humanos na exploração da mãe-natureza? Por onde andam os tais ‘climáticos’ tão afanosos no protesto, mas fugidios no confronto com as questões simples do dia-a-dia? Os ecologistas não serão dos que falam preferencialmente depois das coisas acontecerem, como os engenheiros de obras-feitas, que nunca traçaram um risco por incompetência e ignorância?

Ouvir o role de razões dos técnicos (climatólogos, professores universitários, meteriologistas ou sabichões do ambiente) levados (ou idos) às televisões soa a conversa de inutilidades, onde só apraz a quem se faz ouvir…e com parco proveito à generalidade da população, tal a linguagem hermética, os conceitos exibidos e as insuficientes propostas de resolução…

2. Os culpados – sem mais nem quê é posta em dúvida a possível intervenção dos incendiários, pois as condições como que os desculpam e as condicionantes vão noutra linha de acusação. A deteção de ignições noturnas quase surgem como ‘normais’, deixando de parte a intervenção do fator humano. Com que habilidade se engendram outros causadores da praga de incêndios: interessados na combustão de eucaliptos e pinheiros, pois servirão outros interesses: empresas das madeiras, exploradores do lítio e até o fator cimento em ordem à construção em terrenos ainda não desafetados da zona agrícola.

Sempre teremos de colocar a pergunta: ultrapassando a negligência humana, a quem interessa queimar montes e florestas? O lóbi da culpabilização ainda não fechou a lista dos possíveis causadores de mais uma perda irreparável da nossa fortuna coletiva, que é a manta verdade da nossa paisagem…

3. As consequências para além das perdas da frágil economia rural, vemos que muitos autarcas têm nos fogos florestais uma boa dose para a sua propaganda pessoal e política. Não é mera coincidência que grosso modo o responsável da proteção civil concelhia é o edil de serviço: isso dá-lhe promoção e quase serve de cartaz às pretensões futuras. Não podemos esquecer que, em 2025, há eleições autárquicas e quem pode não deixará de aparecer como o salvador de recurso agora e daqui a um ano.

Em parcos dias (de 15 a dezanove de setembro) tivemos uma área ardida de mais de cem mil hectares, resultando sete mortos, milhares de bombeiros e outras forças de socorro (nacionais e estrangeiras) envolvidas, populações em sobressalto e com dezenas de casas (habitações e locais de trabalho) consumidas pelas chamas.

4. Depois, não se queixem, senhores dos gabinetes com ar condicionado e de falinhas rebuscadas, senhores políticos que se esconderam na hora da tragédia. Há um país que não corresponde àquele que pretendem impingir-nos desde os postos de comando. Cuidem-se, pois a revolta pode custar-lhes o posto!



António Sílvio Couto

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