Sou daqueles que não gostam de férias em agosto.
Talvez seja quase uma raridade, pois uma imensa maioria faz deste mês o seu
tempo preferido de descanso, que, a meu ver, pela confusão de espaços, o
atropelo de pessoas e mesmo o excesso de procura, esse tempo de férias como que
fica condicionado…
Esta quase hibernação coletiva, em tempo de
estiagem, torna-se um ritmo de vida que talvez não favoreça o pretenso tempo de
descanso, não fossem as predisposições para aguentar tudo e o resto por esses
(estes) dias.
1. Custa-me a crer que se tenha de deixar de pensar
só porque se está de férias. Vemos, por exemplo, articulistas que fecham a loja
durante agosto e partem com destino ao nada ou sem lugar para onde. Agora que
pode haver mais serenidade não seria de passar a escrito impressões e reflexões
com maior (e melhor) profundidade? Agora que os neurónios se podem distender,
dado que o stress do dia-a-dia foi atenuado, não seria útil canalizar as
reflexões para assuntos de maior interesse e de possível acutilância? Não terão
ficado para trás temas e assuntos que precisam de mais tempo de aprofundamento
e que o tal tempo de férias ajudaria a colmatar? Por estas e outras questões
considero um exagero que se não continue a veia de partilha/reflexão em tempo
de férias, em agosto ou noutro qualquer mês…
2. Num tempo considerado de ‘sealy season’ vemos que
surgem (ou reaparecem) temas de algum nojo, quando considerados em
circunstâncias normais. Veja-se a exploração de temas de escândalo, sobretudo se
atingem pessoas, entidades ou personagens ligadas à Igreja…numa exploração quase
a roçar o ridículo, ou se não se suspeitasse quem possa estar interessado em
tal fascínio doentio. Dada a quase ausência de temas político-partidários
vai-se escarafunchando em assuntos que possam (pretensamente) dar audiências –
e possivelmente publicidade – nem que seja requentando coisas sem nexo nem
interesse.
Tirando o calor e as praias pouco fica para
entreter quem ainda tem tempo para gastar diante da televisão. Começam a voltar
os jogos de futebol (ao nível internacional e cá por casa), discutem-se táticas
e troçam-se galhardetes de clubismo, acirram-se os ânimos em tempos de
discussão, que tem tanto de inútil quanto de irracional.
À exceção de festas e romarias, vemos arrastar-se o
mês de férias ao ritmo do calor sufocante – este ano bem mais agreste do que
noutros tempos – e dos fogos florestais tão cíclicos quão fatídicos…
3. Com o país inclinado ainda mais para o litoral, nesta
época do ano, vemos como certas regiões se tornam espaços quase irrespiráveis,
tal o sufoco de pessoas, o acrescento do custo de vida e até a possibilidade de
escassez de recursos para alimentar tanta gente e com níveis de exigência
progressivamente crescentes. Agora que os gastos – pessoais, familiares e
sociais – aumentam, vemos diminuir a força de trabalho. Quando o ‘direito’ a
férias se sobrepõe às obrigações de todos e de cada um, precisamos de saber
para onde vamos, não aconteça de sermos beneficiários de regalias que podem
suicidar o futuro a curto e a médio prazo.
4. Na ementa dos eventos deste tempo de estiagem
vemos com realce as diversas ‘festas’ – algumas ditas religiosas, mas onde o tal
religioso serve mais os intentos do popular; outras de teor populista, onde não
faltam as ‘autoridades’ autárquicas e não só a perfilarem-se nos espaços
religiosos; outras ainda que usufruem da designação ‘religiosa’, mas cujo teor
serve para o que serve e vale para aquilo que querem que valha – ocupando e
entretendo incautos, preenchendo programas de fachada e até dando cobertura aos
intentos mais subtis de promotores, executores e beneficiários…
Não fossem os dois anos de interregno das ‘festas’
e estaríamos a maldizer a nossa sorte, pois temos de purificar tanta coisa
espúria que poucas energias nos ficam para fazermos bem o que de menos mau
temos suportado. Queira Deus que sejamos dignos de interpretar o que estamos a
viver…com verdade, humildade e sinceridade!
António
Sílvio Couto
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