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sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

…Principalmente as que mais precisarem!


Por entre as coisas que nos acontecem – de forma ativa ou de modo passivo – encontramos tantos casos que precisam de aferição para que sejam algo mais do que uma mera banalidade. Por vezes há expressões e frases que ressoam na nossa mente e que podem fazer eco de outras realidades…

Quando numa oração/jaculatória de influência mariana se diz: ‘principalmente as que mais precisarem’ como que se faz uma alusão a um grupo restrito, de onde se excluem uns tantos, que se podem autoconsiderar não necessitados e, porventura, com propensão para um certo orgulho senão for mental ao menos espiritual.

Dado que a frase – ‘principalmente as que mais precisarem’ – pode atingir situações diversas, vamos abordar o problema mais como exame de consciência do que como denúncia e/ou lição a dar: 

* Por estes dias participei – como de costume – nas jornadas de formação do clero das dioceses ao sul do Tejo. Éramos cerca de cem padres e diáconos. Notava-se, no entanto, algumas lacunas sobretudo nas faixas etárias mais novas… Certamente não precisam…sabem muito e mais do que os ignorantes participantes e também não têm tempo a perder com mestres a quem teriam antes de ensinar! Mas como se poderá compreender que se possa desperdiçar oportunidades de aprender, de rever conceitos e de aferir linguagens? Os que participaram nestas (como noutras) jornadas são quase sempre os mesmos, são ‘principalmente os que mais precisam’! Com efeito, como se poderá estar em sintonia com as propostas da Igreja universal – a presença dum cardeal de Roma é mais do que decorativa – ou com os desafios de cada diocese, se, na hora da humildade, o que vence é a autossuficiência, a rotina e o tradicionalismo? Não será que ‘principalmente os que mais precisam’ – embora ausentes – não deveriam obrigar os responsáveis das dioceses a questionar os lugares em que os colocam, pois se não estão concordes na aprendizagem da doutrina como poderão estar acertados na pastoral e na disciplina?   

* Nas paróquias vive-se um clima idêntico: ‘principalmente os que mais precisam’ não são os que aproveitam as propostas de formação e de coordenação dos serviços. Quanta ignorância – em jeito de brincadeira há quem a considere o ‘oitavo sacramento’ – se manifesta em tantos dos nossos serviços, grupos e movimentos! Há setores da vida paroquial que continuam aferrados a ritmos cíclicos, mas que não passam da reprodução de saberes bolorentos e com cheiro a bafio. O refúgio em certas devoções – umas mais antigas e outras recentemente recauchutadas como salvadoras sem nexo – dá-nos o quilate de quem as promove, de quem nelas participa ou de quem nelas se ilude… Esses seriam ‘principalmente os que mais precisam’ de renovar as suas certezas e os seus critérios de pertença à Igreja!  

* Atendendo a que todos precisamos de aprender – mesmo pelo estudo e a formação continuamente continuada – ao longo da vida, torna-se inquestionável que ‘principalmente os que mais precisam’ são aqueles que, embora com instrução suficiente para exercerem a profissão – ou até na expressão duma vocação – devem estar em contínua formação, não deixando de estudar e de querer aprender a saber dizer o que se aprendeu em linguagem que se adeque àqueles com quem tratam ou sobre os quais têm responsabilidade de fazer crescer na fé. De facto, não basta saber umas coisas de Bíblia para sermos capazes de a interpretar correta e atualizadamente. O recurso a um certo fundamentalismo bíblico só denota incompetência, má formação e falta de estudo das matérias. Também a necessidade de leitura, de reflexão e de consciência dos documentos da Igreja – do Papa, da conferência episcopal, dos bispos e dos teólogos – exibe tempo e dedicação. Com efeito, neste afã de querer fazer o urgente, depreciando o necessário, faz com que ‘principalmente os que mais precisarem’ possam estar fora do lugar e a entreterem-se com coisas importantes, mas nem sempre as mais essenciais!  

= Na jaculatória ensinada, em Fátima, por Nossa Senhora: ‘…levai as almas para o Céu e socorrei, principalmente, as que mais precisarem’, dá-se-nos uma certa propensão para colocar ao cuidado de Deus, por Nossa Senhora, quem possa estar precisado da misericórdia divina…sobretudo em condição terrena!

 

António Sílvio Couto  



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