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terça-feira, 8 de setembro de 2015

Deixar a criança… com outros


Por estes dias tomei conhecimento duma situação, que tem tanto de surpreendente quanto de inquietante: uma mãe, juntamente com o pai da criança, foram para as vindimas, no estrangeiro, deixando a criança, de seis meses, aos cuidados de uma família amiga da irmã da mãe…mas com quem a criança não tem qualquer convivência… isto terá a duração de dez dias, conforme decorrer a apanha das uvas e por um preço que, segundo, pareceu àqueles pais, era aliciador.

Sem pretender agoirar, esta situação fez-me – desde que tomei conhecimento do ocorrido – pensar sobre vários aspetos, tendo em conta as variantes de um assunto como este: deixar uma criança de tenra idade aos cuidados de pessoas com quem não têm relação de proximidade, indo em busca de uns cobres rápidos e cativadores da atenção…

- Não duvido da afeição que estas pessoas de acolhimento temporário podem ter por aquela criança… até porque já são avós. Há um quê de dificuldade em entender o desprendimento desta mãe que assim parte. Custa-me a perceber as razões totais por muito interessantes que possam ser ao tomarem tal atitude aqueles pais.

- Há, no entanto, alguns aspetos que podem ser refletidos por ocasião deste acontecimento. Desde logo como poderá uma criança, de apenas seis meses, mudar de ‘família’ sem que isso não venha a poder perturbá-la, agora ou no futuro? Pelo que se vai sabendo do desenvolvimento psicológico-emotivo da pessoa humana, a estabilidade de crescimento não deve ser perturbada. Ora, neste caso, terão sido advertidas as mudanças? Quem esteve em primeiro plano desta decisão: os pais ou a criança?

= Num tempo marcado pela mobilidade – uma desejada, outra provocada e tanta outra vivida por necessidade – este episódio da criança deixada com outros (não familiares) pelos pais como que nos deve fazer questionar sobre o lugar das crianças na vida das pessoas, sejam eles pais ou outros familiares e mesmo enquanto cidadãos, pois, desgraçadamente, muitas pessoas preferem os animais – de companhia ou de recreio – às crianças.

- Sem pretender julgar e tão pouco condenar aqueles pais, será que esta criança lhes cria obstáculos para poderem fazer o que querem e por isso a deixam nem que seja por uns tempos?

- Não sei totalmente se precisam desse dinheiro que vão ganhar mais rapidamente para equilibrar a vida, mas uma criança não vale mais do que tantos outros interesses?

- No elenco dos valores, será que uma criança – sobretudo de tenra idade – não deveria ser o melhor critério de dedicação duma família?   

= Quando os refugiados nos incomodam

Tendo em conta o episódio exposto, a situação dos milhares de refugiados que nos têm ‘invadido’ nos tempos mais recentes, coloca-nos numa posição de suficiente vulnerabilidade. Famílias inteiras fogem – a que preço e com que custo – de condições difíceis ao nível humano, económico e até religioso.

Neste tema dos refugiados, como noutros assuntos, continuamos a remandar as consequências sem irmos às causas. De facto, os refugiados – estes que por agora vemos são os que têm meios para comprar a fuga – denunciam a falta de cuidado com que olhamos tantas áreas (lugares e situações) do nosso mundo, mas onde, na maior parte dos casos, os interesses económicos se sobrepõem às pessoas. Com efeito, os americanos mexeram no vespeiro do Médio Oriente, tendo em conta os lucros que podiam usufruir das riquezas de povos e de nações, mas fugiram quando perderam o controlo dos problemas… e, agora, a Europa desunida vai recebendo os milhares de deslocados que, por estes dias, a invadem esfomeados e carentes de quase tudo!

- Será que saberemos dar a estes novos refugiados mais do que condições materialistas dum certo bem-estar à nossa maneira? Teremos estofo e qualidade para sermos homens e mulheres de bem, aprendendo com eles a desinstalação e a procura? Até onde irá a nossa compaixão mais do que a mera solidariedade?

Como continente, que sempre se renovou com vagas de invasões, será que a Europa poderá regenerar-se com novos ideais e desafios para sairmos do comodismo hedonista?    

    

António Sílvio Couto

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