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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Os cristãos podem ou devem estar na vida política?


Com relativa frequência se ouve a questão se os cristãos em geral – e os católicos em particular – podem ou devem estar na vida política. É um tema recorrente, sobretudo em maré de campanhas eleitorais, e que nos deve ocupar e fazer estar informados sobre os conteúdos, os programas, as propostas, as ideologias…dos partidos políticos, sabendo que não são todos iguais nem todos merecem a confiança, o voto ou a adesão dos cristãos e dos católicos.
O que nos diz o magistério da Igreja – concílios, papas ou outras instâncias da vida eclesial – sobre isto que alguns consideram a ‘arte da política’?
Diz a constituição pastoral ‘Gaudium et spes’ sobre a Igreja no mundo atual do Concílio Vaticano II, n.º 75: «É plenamente conforme com a natureza do homem que se encontrem estruturas jurídico-políticas nas quais todos os cidadãos tenham a possibilidade efetiva de participar livre e ativamente, dum modo cada vez mais perfeito e sem qualquer discriminação, tanto no estabelecimento das bases jurídicas da comunidade política, como na gestão da coisa pública e na determinação do campo e fim das várias instituições e na escolha dos governantes. Todos os cidadãos se lembrem, portanto, do direito e simultaneamente do dever que têm de fazer uso do seu voto livre em vista da promoção do bem comum. A Igreja louva e aprecia o trabalho de quantos se dedicam ao bem da nação e tomam sobre si o peso de tal cargo, em serviço dos homens».
Daqui podemos e devemos inferir que a participação dos cristãos na vida política deve ser decorrente da sua consciência social e cívica, levando os critérios do evangelho a este campo da vida em sociedade, não deixando, pela omissão, que outros se aproveitem das lacunas deixadas pela ausência dos cristãos, podendo correr o risco de na vida política – no âmbito geral e na vida partidária – estarem os incompetentes, os oportunistas ou mesmo os que mais influenciam a vida pública pelas ideologias contra a vida, contra a família e mesmo contra a fé.
* Haverá, segundo a doutrina da Igreja católica, partidos e agremiações ideológicas em que os cristãos/católicos não devem nem podem militar, participar ou mesmo votar?
Desde logo todas as formas associativas que conspirem (o termo técnico usado é ‘maquinem’) contra a fé, que abjurem Deus e que sejam fatores de propaganda de ideias de índole ateia, contra os valores essenciais propostos e defendidos pelo Evangelho e a doutrina da Igreja católica. Aqui entram partidos e ideologias de matiz e matriz materialista, mesmo que possam considerarem-se ‘democráticos’…à luz da sua auto-visão.
Sobre o reconhecimento dos direitos políticos ligados à cidadania refere o Catecismo da Igreja Católica: «Os poderes políticos são obrigados a respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana. Administrarão a justiça humanamente, respeitando o direito de cada qual, principalmente das famílias e dos deserdados. Os direitos políticos ligados à cidadania podem e devem ser reconhecidos conforme as exigências do bem comum. Não podem ser suspensos pelos poderes políticos, sem motivo legítimo e proporcionado. O exercício dos direitos políticos orienta-se para o bem comum da nação e da comunidade humana» (n.º 2237). Por seu turno, sobre a intervenção os leigos na vida política, diz o Catecismo, citando a encíclica de João Paulo II, ‘Sollicitudo rei socialis’, n.º 47: «pertence aos fiéis leigos ‘animar as realidades temporais com zelo cristão, comportando-se no meio delas como artífices da paz e da justiça» (n.º 2442).
A título de exemplo da doutrina do magistério mais recente da Igreja católica, o Papa Francisco, citando um cardeal vietnamita, elencou, na mensagem para o 52.º dia mundial da paz (2019), as bem-aventuranças do político, propostas pelo Cardeal vietnamita Francisco Xavier Nguyen Van Thuan, falecido em 2002:
«Bem-aventurado o político que tem uma alta noção e uma profunda consciência do seu papel.
Bem-aventurado o político de cuja pessoa irradia a credibilidade.
Bem-aventurado o político que trabalha para o bem comum e não para os próprios interesses.
Bem-aventurado o político que permanece fielmente coerente.
Bem-aventurado o político que realiza a unidade.
Bem-aventurado o político que está comprometido na realização duma mudança radical.
Bem-aventurado o político que sabe escutar.

Bem-aventurado o político que não tem medo».

Assim sejamos capazes de comprometer-nos na construção da paz pela boa política e com os melhores políticos…possíveis!


António Sílvio Couto


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